O MEU LUGAR

Há quem não morra de amores pelo lugar onde mora. Eu não. Eu amo o lugar de onde eu vim e, hoje em dia, o lugar onde moro. Reconheço cada palmo do seu chão – do lugar onde eu moro – e escolho, quando posso, o caminho mais fácil para se chegar lá, quando venho de outro lugar. É fácil. Basta seguir o caminho da saudade – quando estou fora – e me lembrar do cantinho onde a rede é minha companhia e me chama para armá-la, nas noites em que o calor me convida a ficar ao vai-e-vem de suas “ondas”. Ao balançá-la, a imaginação voa alto e me leva para muitos universos, eles todos poéticos e sem racionalidade. Lá, nesse cantinho, vez por outra, entra uma doce e leve brisa de verão que me acaricia e me faz sentir o dengo gostoso de uma espreguiçadeira indo de lá para cá, num ritmo que me deixa sonolento e de corpo mole.

Ah! Lá onde eu moro tem o cheiro forte das minhas coisas, algumas delas – “as coisas” – intocáveis para todos. É que eu gosto tanto do lugar onde moro que acabei por trazer também aquilo que mais desejo, preservo e quero bem.

Ah, isso acontecia, da mesma forma, com o lugar onde eu nasci. Acontecia não, acontece. Sempre quando eu volto lá ainda encontro as veredas que, antigamente, eram as estradas asfaltadas de dentro do mato por onde eu passava à procura dos rastros dos preás e das pegadas dos tatus e dos pebas que, ocasionalmente, eram as únicas “misturas” para o prato gostoso de feijão com rapadura.

Assim como o lugar que eu moro, eu quando volto ao lugar onde nasci e me criei, quem me leva é a saudade. E como ela se faz presente nessas voltas! Tenho vontade, quando estou lá, de passar muito tempo antes de voltar para o lugar de onde venho e, juro, dá vontade de ficar, eternamente, em seus campos onde os pés de mangas botam tanto na safra, que o chão se transforma em lindos desenhos da natureza que se despoja de si e se dá para que desfrutemos de seus sabores; as que sobram – e são milhares! –, são colocadas em balaios e caçuás e transportados para os caminhões que as levam para o sul do país para, também, serem desfrutadas em seus variados tipos de serventias. Mas, com um detalhe: as mais gostosas, aquelas que os olhos admiram e se apoderam, essas ficam somente os caroços, pois os seus frutos vão direto para o “bucho” de quem esperava, todos os anos, por aquele momento.

Sei, também, que há lugares que são igualmente bonitos – para nascer e para morar –, com árvores frondosas iguais a do lugar que eu moro e, especialmente, do lugar onde eu nasci; que tem serras onde a vontade de subi-las e avistar, lá de cima, toda a esplanada sempre foi o desejo de menino que, depois desses anos todos, acabou virando a vontade do homem – que um dia, quando criar coragem, se tornará realidade. Lugares onde a paisagem é igualmente serena, que dá gosto estar lá e onde o céu se torna tão brilhante que as noites são mais alegres e convidativas que só falta o coro de anjos descer dele para animar ainda mais o terreiro em que se olha para as estrelas.

Sei tudo isso. Mas, sabe o que é? O lugar onde eu moro é mais meu, e eu só o divido com quem se importa, como eu, de estar morando lá. Por isso, quando escuto e leio alguém fazendo uma homenagem ao seu lugar, eu logo o imito, pois copiar o que é bom não é pecado e, muito menos, plágio. É apenas uma maneira singela de agradecer, com bom gosto, ao lugar em que nascemos e vivemos.




Obs. Prosa feita a partir da poesia da escritora Edna Lopes “Não Há quem Não Morra de Amores...”


Obs. Imagem da internet
Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 11/09/2011
Reeditado em 11/09/2011
Código do texto: T3213235
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