SAUDADE DÓI, E COMO...

Certamente se você não for um dos poucos leitores que me acompanha,não entenderá perfeitamente minha perda. Em outras ocasiões escrevi sobre um BAR DO POETA SEM PERNAS. Não, não era um bar qualquer. O bar de Chiquinho poeta tinha alma.

Lá são servidos em meio aos camaões rosadinhos e sirís moles ao coco, uma poesia da melhor cepa. O poeta circulava entre as mesas em sua tosca cadeira de rodas a declamar poemas onde margaridas se misturavam com núvens e mais outras imagens frutos de sua alma poética. O barulho da cadeira desazeitada se misturava a sua voz num casamento perfeito.

O cenário, indescritível. O bar avança pelo rio/mar num desafio a mãe natureza.Na lua cheia, as mesas são lambidas pela agua. A poucos metros, o porto de onde os navios partem com um apito de saudade enchendo o silêncio. O chegar e o partir já se fizeram rotina. Em frente ao braço do rio/mar, uma nesga de mangue borda a areia alva da ilha de Forte Velho. Gaivotas dançam em vôos razantes como a lamber a agua numa visível superioridade. A liberdade vivida plenamente. Alí, o trapiche que serve de ancoradouro aos ônibus do mar que fazem a travessia Cabedelo/Forte Velho, indo e vindo, engolindo agua e cuspindo gente e coisas, num resfolegar cadenceado.

Ontem voltei ao bar. Onde a cadeira, onde os versos, onde a saudação: Seja bem vinda minha poeta/flor. Passe-me logo as novidades. E, se por acaso eu não tivesse escrito nada, logo escutava. Faz isso não, é crime.

O bar continua lá, aparentemente igual. Já não se ouve o ranger da cadeira, nem a voz do meu poeta. Chiquinho partiu sem lamúrias, nem aviso, sem despedida. Saiu de cena deixando um buraco descomunal no seu canto, seu recanto e no meu coração.

Sento na mesma cadeira de sempre. Lágrimas lavam meu rosto. Em vão o cato. Em vão apuro o ouvido. Quem sabe algum verso ficou engalhado aqui na maré. Mas, nada.

Vai em paz Chiquinho. Tentarei continuar a escrever por nós dois. Que tuas gaivotas te levem com ternura e que possas continuar a poetar onde estiveres. O bar continuará aberto, mesmo sem alma.

Mais um poeta vira núvem, vira poesia alada, vira bruma, flor, pedaços de amor.

Até breve, poeta.