MARGARIDA ETERNA JARDIM

Carlos Edyl Santiago filho

No labirinto de canteiros que mantinha longe o mundo e tudo mais que nos punha medo, fomos cultivados na certeza de um esconderijo secreto, repleto de sabores e segredos que Margarida semeava por todo jardim. E era longe, distante também, o momento de crescer e mergulhar nos assuntos que só os adultos discutiam na cozinha antes da hora de jantar.

Bem perto daquele imenso universo, somente a estrada de ferro que tudo trazia, que tudo levava. Existia.

Não nos foi possível perder a hora de embarcar naquele trem que tanta pressa tinha em nos arrastar para outras distantes estações. Vivemos hoje onde achávamos longe. E daqueles sabores, daqueles segredos, restaram somente adocicadas saudades. Saudades do paraíso que Margarida todo dia com seu mundo nos maravilhava.

O que chamam de progresso forjou acesso àquele outrora indevassável universo. O asfalto tomou conta do brejo. Um novo pântano feito de frio concreto. Múltiplas e movediças saídas. Feroz como o trem do tempo, tirou de nós a infância que um dia tivemos nos lançando num perigoso, escuro, absurdo labirinto que é a vida.

Margarida não sabia, como flor alguma saberia, tão arriscada a vida longe dos seus canteiros. E aprendemos sozinhos que, se rendermos ao medo, o próprio espinho que nos protege pode se transformar no punhal que mais nos fere. Sempre quando tantos canteiros não fazemos cultivar, tantos solos não fizemos enraizar, tantos começos deixamos de iniciar pelo receio demasiado de achar difícil a saída desse inescapável labirinto. Como se a alguém fosse possível essa sobre humana certeza. Como se Margarida, ao cultivar, já soubesse o que dentro de nós iria brotar.

E hoje, imersos cada um em seu próprio labirinto, temos nossos canteiros onde vicejam saudades, novas flores, novos frutos, oriundos todos da mesma raiz.

Não sabia Margarida tão extensa sua jardinagem!

Veroz, o tempo arranca tudo da gente, tudo que deixamos arrancar. Levou Margarida para longe dos seus canteiros, mas não tira do nosso jardim a presença da Margarida.

Doce e rústica. Suave e sólida. Pequena e imensa, Margarida eterna em flor.

O verde de seus olhos se esparramam na plantação, fazendo além da intenção da semente, Margarida sempre presente. Nos canteiros de essências nos ensinando a cultivar, nos labirintos profundos da alma, dando coragem para ousar desvendar.

Dos cheiros, dos sabores, dos segredos, dos canteiros, não se esquece. Nos filhos, netos e bisnetos, Margarida permanece. Uma estação- sempre primavera- guardada a sete chaves pelo vô Abílio no esconderijo do nosso peito. Uma semente que insiste em brotar. Uma saudade que nada, nunca ira apagar.

Tantos Canteiros, imenso Labirinto, infinito Jardim.

Por inteiro, sou faminto disso que reside dentro de mim.

Carlos Edyl
Enviado por Carlos Edyl em 15/02/2007
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