Deuses num inverno

Deuses num inverno

Era zênite de um dia de inverno, mas até que estava um pouco quente.

Ele parado, tenso e imóvel, esperava que ela aparecesse de repente, como num truque de mágico, pois já procurara por todos os lados e nem um pequeno sinal de sua presença ou de sua chegada iminente.

Já não olhava para lugar algum, tinha a sua frente apenas uma parede de vidro, o sol sobre sua cabeça, algumas folhas que caiam de uma árvore próxima e muita gente que passava sem notá-lo. E ela, que insistia em não aparecer!

Isso não o preocupava. Sabia que ela viria. Era irresistível aquele encontro para ambos, muitas eras de saudades precisavam ser abafadas e aquelas duas almas desejavam tanto aquele encontro, quanto os corpos que as guardavam tinham a curiosidade de saber como era o corpo do outro.

Eram formalmente desconhecidos. Haviam sentido apenas o fogo do olhar do outro. Um fogo líquido que desceu olhos a dentro penetrando os interiores e iluminando-os por inteiro para o outro, apesar de ter durado um pequeno instante, menor que um suspiro, mas que congelou o tempo, de tal forma que séculos passaram na mente dos dois. Suas almas se reconheceram e se ligaram naquele instante, num sorriso interior.

Ele vivia o sonho da lembrança daquele instante, quando um brilho a sua frente na parede de vidro chamou sua atenção e assim viu sua fada vestida de verde, como fazem as filhas das matas e das florestas para uma festa, chegar deslizando sobre o chão de cimento.

Ele virou-se de um giro no sentido do sol e ela já estava ao alcance de suas mão. Não teve palavras, somente uma alegria de reencontro. Sem pronunciarem nada, nem um ruido ela beijou sua testa, sorriram e abraçaram-se.

Num abraço infinito, os corpos num toque total e perfeito, cada parte encaixada como num quebra-cabeças de amor e saudades. Perfeitos. Imóveis. Alegres. Abraçados completamente, entregues um ao braço do outro, confiantes e triunfantes.

Beijaram-se num beijo longo, suave, etéreo, eterno. Parecia que não havia mais tempo ou sol ou vento e nem se uma chuva chegasse parariam. Nada seria capaz de interromper o desejo de encontro daquelas almas.

A delicada boca de sua deusa era tomada, sorvida, mordida, lambida, sugada, numa dança de eternos movimentos e o abraço se tornava cada vez mais forte e vivo. Aquilo não tinha fim. Precisavam dizer com aquele movimento o que as palavras nunca seriam capaz de exprimir.

O tempo parecia ter acabado ou nunca existido. Quando cessaram, foi apenas dito: Como eu queria isso!

Ele reparou que eles contaminaram o mundo com um pouco mais de amor e com cores de felicidade. Havia pessoas contemplando aquele acontecimento.

Deram-se as mãos e pegaram o Metro, em Botafogo.