Prometida, Jaspir se veste dos cantos dos pássaros e se espraia nas folhagens da floresta! Banhada da pureza dos rios, se deixa tomar do seu cristalino e rebrilha o convite da sua pele ao luar; sua morenice pronta ao amar é grito de guerra que Flecha de Fogo ausculta no chão batido das matas; onde caça, onde luta e passa; onde traça o correr do seu arco!

Prometida, Jaspir se esvai em gozo na corrente que lhe lava a pureza de virgem, a beleza jambeira e o roliço das coxas que se abrem e fecham engolfando a doçura e o moreno dos seus sonhos de prometida, de feitiço e força dos deuses – ah! Flecha de Fogo que anda na mata, que caça onça, que bebe o fel da febre a caminho da promessa de Jaspir! Jaspir é a espera!

Prometida, Jaspir resfolega sob as vagas do rio da fé, altar da cerimônia onde seu amado lhe rasgará as entranhas para no, delas mais profundo, depositar o melhor do seu mel, o céu!

Canta, uirapuru, jacu! Pululem meus peixes e brilhem seus couros e escamas; espanem frescor e alimentem de força a sinfonia da floresta em que, prometida, Jaspir se fará mulher e, emprenhada do fogo da flecha em seu ventre pregada, lavará seu amado do suor do prazer e das feridas da guerra!

Prometida, Jaspir sonha!

Sonha a tenda, sonha a rede; sonha a morte da sede e o desvendar o mistério das sendas do amar! Sonha o dar e o parir; sonha o sorrir e sonha a dor, de prazer embebida, do se deixar por Flecha de Fogo rasgar! Prometida, Jaspir sonha o certo e o etéreo! Sonha o pulsar! Jaspir sonha todos os sonhos do gozar!

Mas, Flecha de Fogo, em meio às massas e ao ulular do inimigo da terra da tribo, cai, de morte ferido, herói do rito! Ah! seu grito e seu sangue ecoam; por toda a terra e os céus reboam a dor do partir, mesmo em glória, na honra dos seus. Do fígado devorado pelos algozes, foge e corre o seu coração e do luto de Jaspir desesperado, vence mata e árvores; corre rios e feras e ao colo prometido se vai; luas e noites mais tarde, em meio às coxas de Jaspir ele cai!

E canta de Flecha de Fogo toda a fé e amor; toda a dor e o tamanho da perda e ao espírito de Jaspir traz certeza e promessa, ato final de fé do guerreiro de flecha ardida: minha querida, nos céus estarei à sua espera em brilho de corisco; em veio de ouro e em prata de sol; não estou morto; sou agora o sal, vivo e divino, o seu celestino! Serei agora sua verdade, sua única e absoluta virgindade!

Prometida, Jaspir reflete suas lágrimas sobre o coração do amado que, acolhido no calor da sua intimidade, por fim, jaz!

Que outro guerreiro terá o fogo da flecha que minhas entranhas tanto esperou? Que promessa outra terá o encanto do guerreiro de que vivi, de cujo cheiro me alimentei por luas e sóis de desejo e querer? Que pajé me encantará por outra pele senão a daquele, única que beijei e de cujo suor me embebi?

Não! Não quero o porquê de outro por que tanto querer!

Prometida, Jaspir vai à busca da lua que, nua, passeia no fundo das águas sagradas! E lá, junto a ela em meio ao sorrir do andar da corrente, brilha a estrela de fogo do seu guerreiro; seu desejar sagrado; seu amado!

Flecha de Fogo e Jaspir agora enfeitam o céu dos deuses da promessa! O altar é para sempre e, prometida, Jaspir, quente, ilumina os amantes da tribo, os sonhos de ritos das virgens que esperam seus guerreiros!

São agora, a poeira que, do terreiro da oca, os pés dos dançarinos do fogo levantam!

Em 03/03/2007 às 22:43h