Bandeira A Meio-Mastro
Céu cinza, fina garoa caía.
O ônibus seguia seu curso,
Assim como cada passageiro -
Retrato estampado da melancolia.
Ela tentou até sorrir,
Ouvindo músicas,
Olhando em torno,
Querendo se distrair.
Parou no farol vermelho.
Ao lado, um triste lembrete:
Um prédio ostentando
O luto brasileiro.
E todo esforço cai por terra
No instante em que a viu
O céu sem cores que,
Com a caída bandeira, contrastava.
Até a bandeira parecia triste.
O vento frio batia
Mas ela não tremulava
Caída, lamentosa, vazia.
Retrato nosso, cotidiano.
"Ela deveria estar assim
Por todos os dias do ano" - pensou
"Posto que tragédias anônimas
Afligem mães, famílias,
Um sem-número de seres humanos"
Ao pensar, ainda mais entristeceu.
"Num país em que a bandeira vive esquecida
Se nos lembrássemos de colocá-la a meio-mastro
Sempre que morresse um brasileiro,
Ela jamais tremularia!
Num país onde a segurança falha
Mas a cobrança não tarda,
Tantos são desprezados, ignorados,
Abandonados à própria sorte...
Seja num hospital, nas ruas,
Ou numa festa noturna...
Estamos todos à mercê
Do Estado corrupto,
Dos empresários gananciosos.
Nós, filhos, avós, tios, primos,
Pais desesperados..."
Pensou tudo isso
E olhou em torno.
Segue o ônibus,
Assim como nós todos.