A NOITE EM QUE O MEDO EMIGROU
Ofendia, humilhava, dava só o que sobrava
e porrada
e ela vivia dia a dia dos sobejos.
Até que a ousadia a rebelara, se ajoelhou pediu um beijo
um simples beijo
o chute veio insuspeitado pegou no queixo
dor e estrago
inaugurado, sem pompa e gala, novo defeito na cara
já tão marcada, tão amansada no medo
e num levante inesperado de tanta vida esgarçada,
desgraçada, esfiapada, vê a garrafa [cheia].
Bate num rítmo ligeiro bóim bóim bóim bóim
até arrebentar a veia e o sangue inundar o olho surpreso
até acabar a dor da raiva da rejeição de todo o dano do desengano
de tanto ano que ficou pra sempre perdido no tempo
até acabar todo o ar que preenchera aquele pulmão
desumano
agora o vento
levara o medo
E lavara as mãos.
[elza fraga]
Publicado no livro "No Fundo D'um Olho Seco"