Ouvindo a alma

Ouvindo a alma

Eu ouço os batuques dos corações das matas, e a cadência calma dos choros das cachoeiras. Viajo nas asas dos pássaros e vejo de cima com o coração partido, as lascas de terras vazias, nuas...Eu moro também no oco de algumas árvores, nas locas de bichos que partiram. Eu vivo na umidade da areia quando a onda vai e na alegria do encontro quando ela volta! eu faço parte do choro da praia quando o pescador vai embora. Sou parte mata, parte mar, pedaços mistos de sal e doce.

Eu ouço o sol se espreguiçando, e a gargalhada da lua quando está nova! Posso tocar o pescoço do vento quando ele passa sem olhar e sempre sinto o cheiro das manhãs e madrugadas. Eu falo a língua dos Deuses distantes, e sou amiga das probabilidades. Quando nasci, um beija flor estava olhando e quando morrer, voltarei para perto do mar, minha casa. Meu sangue é salgado e tem velas brancas passando por todo lado. Penso que sou descendente de alguma ilha distante, onde moravam poetas sem palavras, mas que escreviam com olhares e mãos de afeto. Não sei de que tamanho é essa minha saudade do silencio, queria ouvir o mar cantar...e ver em espelhos translúcidos um pouco do azul e verde que cobre-me em silêncio dos olhos. Sou bicho estranho. Que se estranha tanto, se persegue tanto e foge. Posso ao tocar o chão e encher meus dedos de areia, voar no tempo, eu converso com pedras...sei o nome de algumas. E a sereia que era minha amiga na infância ainda me acena em dias de chuva, no mar. Eu ouço os apelos da terra, os cantos dos índios, o planar de asas e a palestra que entoam as corujas, nas madrugadas. Eu sinto a alma do universo quando vejo a manhã chegar. Ouço os batuques dos corações das matas! pedindo clemência, implorando por sensibilidade e só um pouco de decência...eu ouço corações pequeninos, de frágeis beija flores e fortes animais extintos. Tão extintos quanto eu.

Márcia Poesia de Sá - 2013