Tudo para sobreviver

Certa feita, ao caminhar por um dos bairros de Salvador, há muito abandonado – dentre muitos -, deparei-me com cena que deveras chamou-me a atenção. Ao meu lado, um feixe de blocos amontados – em desordem – demonstrava, em sua fronte, um cartaz, onde se dizia: Casa nº 1, em cima; casa nº 2, embaixo. Casa de nº 3, ao lado.

Aquilo não é casa; é domicílio.

Em hipótese alguma aquilo é casa, ainda que muitos a amem e a tenham assim – pois tudo isso foge à ideia básica de dignidade.

O esforço contínuo para continuar vivo anula qualquer hipótese mínima de percepção de que aquilo jamais foi uma casa.

Estamos engasgados demais com esse mundo que obriga. Obriga a sobrevivermos, cada dia, para que o próximo seja tão somente como o anterior – com vida. E isso é tão forte que não nos faz ver além.

Disseram-nos que hoje tudo é diferente. Avisaram-nos que somos livres e conscientes do que somos e do que podemos. E mentiram.

Enxergar ali uma casa é mesmo que dizer que tudo está bem, tendendo a estar cada dia melhor; é dizer que antes nem isso tínhamos, e hoje temos.

Temos o quê? Um amontoado de coisas onde uma vida se sobrepõe à outra?

Não sejamos hipócritas... Vida onde o espaço do outro é conflitante com o nosso próprio não é vida, porque todos nós necessitamos um espaço mínimo conosco, sem intervenções.

A verdade é que fazemos de tudo para sobreviver.

Diego Guimarães Camargo
Enviado por Diego Guimarães Camargo em 02/05/2013
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