Os fragmentos de uma vida

Estou num projeto de pesquisa,

Tema que muito me agradou!

Como projetar nosso envelhecimento,

Nossa solidão e as redes sociais.

Adorei o tema, pois me incluo nele de corpo e alma!

Envelhecemos, é a lei da vida!

A solidão nos invade em qualquer situação!

Seja no meio familiar,

Seja no meio asilar!

Como encarar as transformações,

Do corpo, da mente, e inclusive,

Do aflorar de uma sexualidade,

Que imaginava adormecida,

Vindo agora me acordar!

As redes sociais tem suporte,

Prs essas mudanças?

O tempo é sorrateiro,

Nos pega de surpresa!

Atrapalha todo o meio de campo!

Não adianta teimar contra ele!

Chegou e ocupou seu lugar!

Bom, apelamos pras redes sociais,

Procuramos amigos jovens,

Amigos maduros, ou mesmo, de nossa idade,

Para teclar, como dizem meus amigos,

Claro, que apenas alguns se dispõe a dialogar!

Na maioria das instituições asilares pesquisadas, hoje,

Existem a net, e laboratórios, á disposição dos internos,

Que vivem o dia a teclar!

Fiquei um pouco surpresa!

Usam vocabulários de internautas adolescentes,

E eu aqui a me envergonhar,

Dos textos que escrevo para meu amigo,

E grande parceiro, que convive,

Nesta mesma solidão!

É parceiro, tem outras vovós por aí!

E como tem! Só queria Mudar este tema,

Terceira Idade, Solidão e Redes Sociais.

Pois hoje nos cabe o direito,

De sermos uma classe,

Se um tivemos, infância,

Puberdade e adolescência,

Balzaquiana, hoje estamos,

Eu e algumas amigas,

Na cabulosa Terceira Idade!

Como estou pesquisando sobre o assunto,

Gostaria de citar uma senhora,

Dona Lia! Oh dona Lia,

Me desculpe por contar sua história!

Um caso de amor tão lindo,

Não deve ficar escondido!

Como em tão poucos dias,

Descobri em você, o que gostaria,

De contar em meu livro!

Parece coisa de filme, mas não,

É a história de Dona Lia!

Vai fazer setenta anos,

Vive um amor escondido!

Me disse que seu amor,

Iniciou'-se na adolescência.

Seus pais mudaram pra outra cidade,

E nunca mais o viu!

Hoje ela vive nesta casa de repouso!

Tem netos, uma família feliz!

Só que para polpar sua família,

Resolveu viver naquela Casa de Repouso!

Bom, na verdade, o imóvel ê da família!

Quando lhe perguntei sobre o que fazia,

Respondeu-me que ali tecia, pintava,

E namorava, e eu curiosa, quis,

Saber como fazia, como se encontravam!

Respondeu-me de supetão:

_Pela net! Você também não o faz?

Respondi que sim, mas que nem sempre,

Isso pode ter um final feliz!

Espantou-se! _Comigo deu certo!

Foi aí que encontrei meu amor de outrora!

Ele também não se esqueceu de mim!

Não me visita, mas olhe estas flores!

Ele manda pra mim!

Fico horas a conversar com ele!

Escrevo-lhe poesias, e ele me manda livros!

É um eterno romântico,

Combina comigo,

É como se nós estivéssemos juntos!

A única coisa que me incomoda,

É a distância, que existe entre nós!

Fico louca pra chegar o anoitecer!

Pois ele vem conversar comigo!

Às vezes, não sei como,

Ele entra no meu quarto sorrateiro!

Fica a noite inteira comigo!

Me conta, casos, me fala de seus amores!

Pois ele também se casou um dia!

Diz que foi feliz, mas um dia se foi!

Quando chega a hora, o apito do trem,

Não espera! E ele ficou só!

Seus filhos casaram-se, mudaram,

Cada um pra um canto!

Dona Lia me pergunta, se eu também,

Já tive um caso de amor assim!

_Claro Dona Lia, eu também tenho meu caso,

Um pouco diferente do seu!

Mais complicado, talvez!

E ele não me manda flores!

Mas eu também lhe escrevo poesias,

Que talvez, ele nem leia!

Eu vivo somente em sonho!

Diferente um pouco do seu!

Sonho com ele todas as noites!

Sinto também esse desejo louco,

Que ele venha deitar comigo!

Achei que isso só acontecia comigo,

Mas acontecia comigo e Dona Lia!

Estranho o caminho que tomamos!

Mas nosso caso é um baú de solidão!

Que parece transbordar por onde passamos!

Quando terminei meu trabalho,

De entrevistas com várias senhoras,

Falei com a coordenadora da casa.

Ao agradecer-lhe por receber-nos,

Ela me pediu pra sentar um pouquinho,

Pois queria falar comigo.

Perguntou'-me sobre o projeto,

Se conseguimos nosso objetivo.

Disse'- lhe que sim, e como foi bom,

Poder conversar com Dona Lia!

E ela me disse:_ Pobre Dona Lia!

Solidão mora em seu quarto!

Fica ali no seu notebook,

Vive num faz de contas,

Que conversa com ela na telinha!

O Alzheimer, chegou bem cedo!

Seus filhos, moram distantes!

Esta casa é dela,

Como procurávamos um imóvel,

Ela nos foi cedida, e cuidamos de Dona Lia!

Chegue aqui na janela,

Olhe como é lindo este jardim!

Ela cuida dele com muito carinho!

Sempre aos domingos,

Levanta bem cedinho,

Faz lindos arranjos,

E coloca nos quartos de cada uma!

São oito senhoras que vivem aqui!

Coloca também no seu quarto,

E diz ás amigas, que foi seu amor que mandou!

Faz com que suas amigas fiquem feliz!

Na verdade, seu amor não existe!

Ela fica ali a conversar com ele!

Diz que escreve-lhe poesias,

Mas respeitamos sua privacidade!

Talvez ela tenha na lembrança,

Seu marido, um outro namorado talvez!

Vive ali somente feliz!

Nunca reclama de ausências!

Seu mundo real vive ali,

Naquele quarto, cheio de fotos,

De alguns ela sabe o nome,

De outros ela diz não lembrar do nome!

Numa moldura ao lado,

É a foto do seu marido,

Mas ela diz quê não é ele o seu amor!

Quando perguntamos pra quem ela escreve,

Ela chega até a janela,

Aponta o dedo para o alto,

E diz:_ vocês não podem vê_lo!

E nós que cuidamos dela com tanto carinho,

Nunca procuramos ler o que ela escreve!

É privacidade dela!

Carinhosa com suas amigas,

Sempre encontra um motivo,

Para brincar com a vida!

Promove festas, como no filme,

A Festa de Bebette! Nós ajudamos,

Pois vivem na maior alegria!

E essa alegria nos contagia!

Deixamos que convivam com seus sonhos!

O mundo irreal pode ser mais bonito,

Do que o nosso, que saímos,

Convivemos com nossa família!

Chegou a hora de encerrar nosso projeto.

Como isso me tocou o coração!

Encontrei ali, alguém que também amava,

Um ser talvez que não queira,

Corresponder o meu amor,

Que não se lembrará, de me mandar um alô,

Na impossibilidade de mandar uma flor!

Mas quem me deu esse direito de sonhar?

Sonhei por que quis, e vou continuar a sonhar!

Não tenho a doença de Dona Lia,

Mas vou esperar uma flor,

Do meu namorado, quem sabe,

Um alô, um bom dia!

Enquanto não chegar o verão,

Não poderei ganhar meu abraço,

Não poderei chorar,

Pois não há quem me seque as lágrimas!

E entre os fragmentos de uma vida,

Cheio de solidão!

Continuarei a escrever-lhe meus versos,

Que não sei se ele vai ler!

Acredito que não! Ele quer somente paz!

E talvez viver nesta mesma solidão!

Indo só, pedalando uma bicicleta,

"Vendo imagens nuas" pelo caminho,

Que tem que trilhar todos os dias!

Pois minha companhia não quis!

Sou somente fragmentos de uma vida!

Pra mim não haverá uma festa,

Nem nos dias dos namorados!

Mas se eu pudesse eu faria,

Pra vocês meus amigos, pra ele,

Que me faz sonhar!

Uma Festa de Bebette!

Mesmos juntando todos os recursos,

Que me sobraram desta vida,

Cheia de solidão, enfeitadas com minha alma poeta,

Que brinca de fazer poesias!

Que espera por um verão,

Que alguém me espere num aeroporto,

Me abrace, e que eu tenha um feliz dia!

Vó Didi
Enviado por Vó Didi em 07/06/2013
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