Existindo sem Viver

Invejo o vácuo de linguagens e de sentimentos das pedras

Que não vivem, mas suportam silenciosamente o peso colossal da existência, pois amar ou odiar a vida é estar moribundo das ideias,

Afinal a vida, nossa vil progenitora, nos engendrou para nada

A fim de estarmos sempre o mais longe possível de seu olhar hipócrita,

Junto com todos os redemoinhos de mágoas que represamos em nossas almas.

O crime absurdo de continuar respirando,

O erro intraduzível de ter nascido,

A culpa inexpiável de se necessitar conviver com os outros,

O pecado abominável de abrir os olhos e sentir o pavor da luz solar

Que ainda emana em vão restos mutilados de luz lá fora.

A sede de viver e de morrer jorra apenas pretextos e desculpas em nosso sangue,

E há mais humanidade no orvalho das folhas das árvores

Do que as lágrimas de milhões de crianças órfãos e esqueléticas,

mas meu coração fecha os olhos e escuto a sonífera cocaína do mundo.

Esta heresia de se nadar nos abismos da fé;

Essa ridícula chacina dos comércios, empresas, igrejas e escolas;

Maldita enfermidade cardíaca que nos coage cegamente a amar,

Neste círculo de tudo querer e nada se precisar,

De valorizar intensamente a qualquer coisa

Que já nasceu fraturada, podre e infecunda;

De cuspir méritos e culpas nas próprias dores e brilhos,

Quando o universo é o esgoto onde a Indecência nos defecou

Depois de bilhões de anos de embriaguez.

Aqui não estamos: anjos apagados e cheios de excreções,

Banidos do furor da morte e dos êxtases dos paraísos;

Aqui nunca estivemos: esfinges débeis cujas asas de todos os mistérios

Foram castradas ou antropomorfizadas pelas convicções ou racionalidades de vitrines e de prostíbulos luxuosos.

Cumprimentando a pele leprosa das superfícies das ações e coisas,

Andando sempre à deriva no mesmo lamaçal denominado de “Cotidiano”;

Suando e rezando,

Suando e comendo,

Suando e procriando vermes,

Suando e sendo estuprados a cada instante pelos risos da Desgraça,

Entre copos em cima da mesa onde o Destino vomitou

Esta nossa lucidez aleijada, delirante e ciumenta.

Viver significa crer e duvidar, esperar e iludir-se?

Viver é lutar e novamente cair, é enganar e enganar-se deliberadamente?

Viver apenas significa que tudo é a mais atormentadora insignificância?!

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 30/06/2013
Reeditado em 30/06/2013
Código do texto: T4365370
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