Desnudar-me

Desnudar-me!

Quero desnudar-me de mim mesma, já pensou? Acordar sendo outra pessoa, mesmo que com problemas diferentes. Retirar de mim um pouco de quem eu sou e colocar mais do que não sou. Não cumprir regras, mas arrastar os móveis para o canto, respirar outros ares, ser mais que eu fui ontem.

Acordar cega e aprender a ver apenas o lado bom das pessoas. Ter a sensibilidade do toque que tantas vezes me desespera; nascer novamente, talvez em outro tempo, um tempo em que os filhos não matavam os pais e em que os pais não matavam os filhos. Libertar-me do cenho franzido que venho trazendo comigo nos últimos anos, diariamente, ao ver o perigo eminente que corre no ar, ao me preocupar diariamente com meus entes e - por que não? - com meus dentes.

Quero voltar a ter faro, isso mesmo, faro. Faro aguçado como os cães que sentem o cheiro do perigo - isso já não tenho mais. Aproximo-me de quem não devo e me afasto de quem eu deveria me agarrar, tudo por conta desse tal de faro.

Aos dezoito queria a maturidade para fazer tudo; hoje posso fazer tudo e queria a inocência dos 18 anos quando não ter medo do perigo, quando a dor nas costas era só um mito, e correr riscos fazia parte da minha jornada diária. O amor também era livre, cheio de tabus que precisavam ser quebrados, mas acabaram banalizados. Hoje ... acabou o mistério, não sei se isso é bom pela liberdade ou se é ruim, pois a mesma liberdade nos acorrenta, nos deprime e faz adoecer a alma.

Desnudar-me dos meus ais! Aliás, são tantos ais que não vale a pena citá-los. Por que esperamos mais das pessoas do que de nós mesmos?

Entregar-me ao vento... isso seria fantástico. Abrir os braços e voar não para a morte que nos sonda dia a dia, mas soltar-me para voar em meio às palavras, aos sentimentos, às lágrimas, aos nãos. Seria tão bom aprender a gritar “não”! Simplesmente “não”!

Queria desnudar-me não de mim mesma, mas de todos os conceitos em que me fizeram acreditar um dia, e desnudar-me das regras de religião, ortografia. Estas me atormentaram a vida inteira e, agora, decidiram renová-la, simplesmente... é isso - talvez este seja o segredo - pode ser que eu queira ser como a nova ortografia: chata... mas igual para todos os povos; cheia de regras, mas desnuda de fronteiras. É isso! Hoje é dia de quebrar as fronteiras.

Izabelle Valladares