Minha Manhã em Prosa e Verso

Há certos momentos em que a vida se faz mais presente e nós a sentimos com mais fervor. É o momento em que o poeta colhe uma inspiração, o jardineiro admira seu jardim, o filósofo se compara as estrelas e desliza suavemente seu pensamento para um riacho tímido que, humildemente, contorna as pedras. Como se se sentisse tão grande e tão distante dos homens ao apreciar coisas tão pequenas. É o amor que se faz notar no gotejar da água que escapa de um cano. Talvez por lembrar as batidas do coração ou simplesmente a ideia de movimento e quem sabe senão a sensação de liberdade. É o amor que se faz notar na manhã que poderá ter sido mais bela, porque o que a caracteriza é justo a sua presença, surgindo com um bocejar quentinho, anunciando:

"Estou aqui".

Já sou filho desta manhã e sinto despertar em mim o poeta, o jardineiro, o filósofo... Embebido neste paroxismo afasto a imagem de filho e me atrevo em colocar-me a sua altura. E exclamo:

Manhã linda de sol

Eu saí pra te ver

Manhã linda de sol

Quero casar com você

E ela me confessa, naquele cheirinho de terra molhada, enquanto eu ainda dormia, ter-se fechado em pranto. Eu a consolo:

Manhã linda de sol

Se te vejo chover

Manhã linda de sol

Só me vejo sofrer

E me lembro daquela longa temporada de inverno quando me sentia prisioneiro, prisioneiro da chuva. Mas, não negava sua utilidade. E pensava: esta chuva, ainda que fria, quase intolerável, que cai como soldados cercando um Forte e arrasta na leve enxurrada a esperança de rever o sol, cessará por fim e ela mesma fará florescer uma linda primavera e mais linda no momento em que surge. E outros invernos virão e outras primaveras também, estou sempre pronto a recebê-los. Sonho com o futuro e amo o presente. Belo é caminhar numa estrada e fitar o horizonte, mais belo e confortante é notar que existem flores no caminho. Em meio a esta divagação outros versos nascem:

Manhã linda de sol

Quem me vê com você

Pensa que estou sozinho

Pois não pode entender

Que tenho seu carinho

Manhã linda de sol

Nosso véu é o céu

Nossa lua é de mel

Nossa vida é ao léu

Acabo de fazer uma poesia e me delicio em repetir aqueles versos. Eis que, um vil pensamento numa frase me corta a garganta: -Neste mundo de números e máquinas:

"Somente os ociosos têm tempo para divagações". (Lembro do Pequeno Príncipe de Saint-Exupéry)

Se esta poesia e outras não se converterem em dinheiro nada valerão. Mas, um pensamento mais incisivo me enaltece:

O verdadeiro valor de um poeta esta na grandeza de sua imaginação e não no ouro que a reflete.

Mais uma vez Saint-Exupéry me vem à memória:

"Na verdade quem luta apenas na esperança de bens materiais não colhe nada que valha a pena viver".

O passado é o rastro de uma bagagem adquirida, se amanhã eu morrer não vai me faltar o peso das relações humanas e já terei adquirido muita coisa e muitos serão os que seguirão os meus passos e isto me traz a certeza:

Não morrerei vazio.

www.ruimontese.com.br

Rui Montese
Enviado por Rui Montese em 26/02/2014
Reeditado em 14/12/2019
Código do texto: T4707501
Classificação de conteúdo: seguro