Despedida dos sons

Despedida dos sons

Na surdez das manhãs, ainda ecoam os bramidos do que repetidamente não foi dito. Desapontamento são como cicatrizes que nos impomos. E quando ocorre, apenas cato meus pedaços e sigo em frente. Ha algo em mim que já não suporta sofrimentos. Meu espírito já não quebra, posso ser a matriarca de sua infância, e enquanto ninava suas distâncias, via dormir meus sonhos afinal, fostes o único para mim.

Palavras carregam bem mais que puro pigmento, ha tão mais que tinta em cada tela nascida e nos poemas, extremamente mais que possíveis rimas, ha emoções que brincam entre realidades e fantasias, ha vida perene na frágil morte de cada um, e de cada dia, assim como ha morte em cada manhã. Os riscos que rondam os sonhadores são grandes demais. Pungentes demais para serem ignorados, os olhos viram cristais quando amamos demais e isto é um fato tão recorrente quanto o ar que insiste em entrar e sair dos pulmões.

Qualquer adeus dito, é mais silencioso que o adeus dado a si próprio, na solidão de nossas próprias conclusões. E quando carregares na mala meus sonhos, leva contigo meus olhares apaixonados, dobra em um envelope cada poema que te fiz, e tudo mais que eu costumava ser. Sei de teus medos, sei do som do teu sono, sei das doçuras, das agruras, e juro só guardar os risos.

Adeus meu amor, adeus meu amigo, tu fostes tudo, fostes tanto que fostes embora, assim como tudo parte e partida em milhões de fragmentos, sigo pelo vento como areia branca em ventania. Deixemos ao futuro este futuro. E abandonemos no passado o que passou, o que não passou e até mesmo o que poderia ter sido e talvez jamais tenha sido. Talvez na verdade, nada seja! tudo faça parte apenas de um romance que ainda escreveremos. Quem sabe numa linha ou noutra por ironia da memória do subconsciente ainda nos encontremos.

Quem sabe tudo não passou de um sonho, um breve sonho que desfez-se nos primeiros raios da manhã, quando as vozes se confundiram, quando os toques dos sinos cessaram, ou quando o céu nublou e as noites foram tornando-se mais e mais amenas.

Adeus meu amor, adeus meu amigo...vou exatamente como cheguei. Agarrada e impregnada em um poema sem o menor sentido. Ridículo como todo amor costuma ser. E na vastidão do abismo só uma coisa fica, o perfume que jamais sentimos, as flores que não chegaram a abrir em nosso jardim, as músicas que não ouvimos...

A dança que dançou sozinha na lua cheia, o brilho que escureceu, o mar que esquivo virou lago e congelou no inverno. Enfim, levaram meu sonho, rasgaram-no como papiro envenenado, queimaram todas as pirâmides, e explodiram o dia. E enquanto meu mundo perde lentamente as cores, fecho a maleta de pintura, lavo e enxugo os pinceis, bato a porta do ateliê e vou embora de mim.

No mais...não mais!

apenas o verso mudo, um adeus ao mundo e fim.

Márcia Poesia de Sá

Márcia Poesia de Sá
Enviado por Márcia Poesia de Sá em 20/03/2014
Código do texto: T4736133
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.