UMA SALA DE ESPERA
Parecia o som de um piano. Algo que já ouvira muito tempo atrás, quando fazia sentido sentar-se sozinho e esquecer que o mundo era feito de todas essas coisas feias. Mas o fedor de tudo em volta deixa o corpo impregnado. Ficando cada vez mais difícil ser indiferente. Não, o som do piano não fazia mais o menor sentido. Tantas eram as preocupações com a marcha para a morte, que perdia-se aqui e ali alguma nota importante da música. Ficava o gosto amargo da boca e a sensação de algo que foi arrancado de si, sem a menor possibilidade de alívio.
Na parede da sala branca era flagrante o vazio. As paredes eram as principais testemunhas de uma música sem nome. Algo que não pertencia aos acordes e escalas da música audível. Alguma coisa que precisava ser inventada. Mas o que seria?
Com o tempo, entende-se que se nada é irreversível, também não é definitivo. E por isso mesmo, quando o último acorde soou, a sala retornou ao seu estado original: um hiato no tempo, feito para a espera.
As botas do homem que esperava, passaram a fazer algum barulho enquanto caminhava para fora. E deixando para trás a inconformidade e a ânsia, decidiu nem fechar a porta. Aquele cubo branco não o pertencia. Era alheio e indiferente. Assim como seu próprio corpo. Um provisório receptáculo para a consciência, emprestado pela natureza.
Não pertencer é o que mais se aproxima de uma explicação para a vida. E quando o homem partiu, deixou parte de suas dores em modo de espera. Pois sempre haverá uma ilusão vaga em um mundo vazio ou uma sala de espera.