A Relva Regada é Feliz

'Hoje o sol não quis o dia, Nem a noite o luar.'(Lenine).Leio tudo isto com Freud e vejo coisas...

Quatro personagens metaforicamente atrevem-se a contrariar o dado, o esperado, o comum. Sol+lua=usual, dado, esperado; noite+dia= usual, dado esperado.

Entretanto há: dias, vezes, ocasiões, que não se quer nada dado, usual ou comodamente esperado.

O que se quer é a desconstrução, de tudo, o avesso do avesso. Se quer mesmo é dizer não a calmaria e sim a tempestade, não a leve brisa e sim a ventania.

Arriscar-se sabendo que com certeza vai-se literalmente 'quebrar a cara', mas é o que se quer, o inesperado a cruzar-se ocasionalmente,sem padrões. Entrar em órbita de colisão só para sentir, gozar, a suposta e desejada pureza de um abraço, de um beijo bem dado, seja lá onde for, abaixo ou acima do equador. Formou? Não? Que pena, dançou, tenta de novo, mas tenta querendo, porque esta órbita existe, em ti, em mim, por aí, perto. Só precisas entender e adentrar ao movimento e tem que ser na direção inversa e contraria, senão vais eliminar a possibilidade de encontro. E vais ficar para sempre como sol e lua, noite e dia dualidades que parecem feitas uma para a outra, mas que nunca se encontram verdadeiramente.

Se queres o teu abismo (inferno particular), continua na tua área de conforto e vegeta lentamente até o fim. Continua, se o teu prazer é fazer-te coleção privada de angústias e frustrações segues o dado, o usual e o esperado. Ui!!!? Vais mesmo sem dúvida mergulhar, com poucas chances de respirar, mas nestes casos há que esperar-se que nem vais precisar respirar.

E vais pensar:

-Estou caindo sozinha num Abismo de uma parte de mim.

Já conheço este lugar

Quem me leva pra lá?

Ninguém, eu mesma(o) sei o caminho

Conheço a instabilidade do lugar

A dificuldade não é propriamente chegar lá

O problema é emergir daquele fundo escuro e frio lugar...

Pois... Tás vendo? A vida não é fácil. Pensando bem,

As pessoas em vez de terem todas seus abismos particulares,

Deviam ter paraísos particulares.

Mas peraí, pensando bem elas todas, os têm.

A diferença está na voluntariedade de cada viagem, pois

pro paraíso vai-se quando se quer. Parece fácil e acessível, além de muito prazeroso.

Mas quando se vai ao abismo de si, não há escolha nem voluntariado.

Lá simplesmente as pessoas sem opção se jogam ou são empurradas... Ou pior acreditam que isto acontece.

No paraíso tudo se vê, tudo se conecta numa perfeita sintonia, e o resultado sempre é o prazer pleno, a satisfação da felicidade garantida por menor que seja, sabe-se que está lá. Upa!!! Que bom vou lá buscar a minha!? Era o que todos deviam pensar, sem medo de ser feliz.

Mas nos abismos particulares, a luz é só o pensamento, a força para sair de lá vem justo dai.

Lá não existem outras pessoas, a falta de motivação é total, não há estímulos externos, tudo tem que fluir da própria pessoa.

Mas ela está no abismo e o pior momento é descobrir que não dá para descobrir como voltar e para onde.

Emergir de si demanda tempo e a energia vital, que vem lá no fundo dos abismos humanos é muito escassa.

E neste estado de alma há tantos reparos a fazer, tantas coisas para consertar, tantas palavras para dizer, mas a quem?

O estado de solidão no abismo de si é pleno.

Só resta você mesmo, e pode lhe ocorrer de criar na sua mente um(a) outro(a) você.

É neste momento que a conversa vai longe, e as questões surgem de todas as situações que conduziram o ser aquele seu abismo.

O sensor existe e também é você. E a cada resposta errada seu nível fica ainda mais baixo e o abismo aumenta.

Nada, ninguém pode ajudar. É um estado de agonia que se debate anulando o tempo e o espaço, tentando aniquilar o que resta do que se foi.

E resta a última esperança que é descobrir o inimaginável: dentro do outro tem você, mas dentro de você tem o que?

E isto é o eterno retorno do mesmo, tenta sair desta, sem crise. Evita estes abismos, tenta fazer teu mapa interior, perder-se é fácil, o difícil é encontra-se. A vida é bela e a felicidade existe, tá bem aí, ao lado esquerdo do peito.

In: ' A Relva Regada é Feliz' Prosa de Ibernise.

Barcelos (Portugal), 17OUT2014

Ibernise
Enviado por Ibernise em 16/11/2014
Código do texto: T5037384
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