Cannery Row
Lee Chong é um comerciante chinês que mora em Cannery Row!
E ele sabe porque está lá, ou pelo menos deveria saber!
Lee Chong flutua entre o ábaco e a caixa registradora dentro de sua mercearia!
Estamos em Cannery Row, Monterey, Califórnia, são 9h15 a.m.!
Lee Chong acaba de abrir sua mercearia... Uma nostalgia o abate como um vício que inebria!
O lugar se parece com um poema inacabado, um cheiro que envergonha, um latido na madrugada que incomoda quem dorme!
Cannery Row não é uma cidade, é um ajuntamento urbano confuso...
Confuso e tumultuado... Cinza e fétido, de concreto e ferro, cheira a ferrugem!
Madeiras podres, peixes quase podres, prédios pichados e calçadas quebradas!
Terrenos baldios transbordando matos e pilhas de lixo por toda parte!
Comércio falho, escritórios que te empurram para baixo e albergues ordinários!
E essa confusão, enfeita como moldura o mapa-quadro dessa cidade.
Fábricas de sardinha, tabernas imundas, restaurantes e bordéis também ilustram sua paisagem!
Seus habitantes são ratos, cachorros e peixes mortos!
Meretrizes, cafetões, jogadores trapaceiros, vagabundos e filhos da puta!
Mas, se os olharmos com outro olhar, esquecendo a importância do dinheiro!
São como anjos, santos e mártires!
Trabalhadores abençoados que sustentam suas famílias pobres e abençoadas!
E tudo isso significa a mesma coisa!
Tudo isso é Verbo e o Verbo te desafia a amar do outro lado da rua.
E o Verbo é um símbolo do prazer que suga os homens e seu tempo!
O Verbo suga fumaça, suga árvores, apodrece flores e fábricas!
O Verbo vem da Coisa Humana, o Verbo dá-nos pressão!
A Coisa Falada se torna Verbo e depois volta a ser Coisa Humana!
Outra coisa, a mesma Coisa!
Outro verbo, o mesmo Verbo!
O Verbo mastiga Cannery Row, digere-a na boca e vomita-a pela mesma boca!
E o vômito escorre pela sarjeta destruindo as malditas baratas aladas!
Desce corroendo o asfalto, como um ácido corrói o aço!
E enche de buracos a Rua das Ilusões Perdidas!
E só as formigas é que não morrem!
Só as baratas causam pavor!
Só os ratos são companhia, de verdade!
*Texto extraído e adaptado de:
"A rua das ilusões perdidas", John Steinbeck (1945).