A CONDENAÇÃO DO VERBO

Senhor juiz, ela tem pensado muito sobre o resultado afetivo de sua vida.

Andou pelo mundo ajuntando pedacinhos de saberes. Era preciso romper com crenças limitantes e crescer. Inevitável pagar o preço do saldo negativo de afetos. Limitada ao estado de solidão de quem escolheu o incomum, sobreviveu.

Com o passar do tempo a fêmea requer um ninho, mesmo que seja vazio. Nunca foi capaz de vender seus sonhos, nem trocá-los por nada. Os mais preciosos guardou durante décadas, herméticos. Reflexo, talvez, daquelas velhas crenças.

Certa vez houve pequena trégua e a coragem de ser um par aconteceu, mas por obra do destino, foram poucas primaveras e o que não era bom vinho se esvaiu em pó.

De volta ao lugar de onde veio senhor juiz, descuidada, olhou aquele amor antigo e nos versos acalentaram a necessidade da mesma condenação ao pensar e renasceram os novos velhos desejos... Juntem-se pitadas de afinidades, um cadinho de afeto, um molho de Poesia, um sobre gozo bilateral e uma quase infinda disponibilidade para o ato de amar sem pudores.

Então, senhor juiz, por favor, entenda que a ré aceita a culpa que seu ego tentava negar. Enquanto seu alter ego só pedia pra nunca mais deixar que fosse diferente. Não por possessão, mas por saber com a maior das convicções que outro romance assim não haverá de ser enquanto viva estiver.

Declara-se culpada e pede que a condene a ser feliz no amar e que a pena máxima seja o desafio de não deixar, jamais, que a chama se apague.

- DO LIVRO TERCEIRA PESSOA, 2015