Clamor do Primeiro Dia

Clamor do Primeiro Dia







Os dias se repetem, surfando do primeiro ao último, embalados por um clamor. Na sequência ordinária essa súplica troca de vestes e se traja de petição. Mais para frente pode se tornar uma arenga, um juízo, mas no dia inaugural faz-se um pedido no plural para que venha a nós o vosso reino e se instale no singular fornecendo ânimo e inclinação para consolar ao invés de ser consolado; isso se repete, cadenciado, delineando um registro subconsciente repetitivo, aja com fé e a fé virá, lance mão do botão do pause para formatar o ângulo plausível acerca das atribulações de agora: nada além de situações solicitadas para aprendizado.

No primeiro dia, três vezes por dia. Nos subsequentes a oferta é livre, permanecendo o registro subconsciente repetitivo aliado a capacidade de transcender, por uma vida de confiança em poderes que estão além de você, deles, de nós. A virtude da prece não se encontra na busca, mas na postura da busca - trampolim intermediário entre estar perfilado ou deitado. "Ajoelhe-se, disse o sábio, você pode fazer algumas coisas, mas não todas as coisas”.

O esportista apaixonado pela vida Ricardo foi despachado com três tiros nas costas por um psicopata com amparo institucional. O Presidente do Senado Brasileiro ostenta a tarja de Ficha Suja e seu nome anda grudado em mais de uma encorpada falcatrua.

No primeiro dia sabe-se que quem canta ora duas vezes, que o mal parece ubíquo e o contexto anterior carente de etiologia. Aquele em mantra por vezes se acha canhestro e mesmo assim seu silêncio voa e acerta por merecimento de seu profundo anseio de justiça. Darwin estava equivocado. Os ambientes sobrevivem como sistemas. Tudo o que auxilia equilibrar prevalece. A sobrevivência do mais “adaptável” ora pelo equilíbrio.

Clama-se pelo sopro que espanta adversidades, para que vidas possam ser aprimoradas, então diferentes, dignas, salvas. Desde a alvorada ocorre tímida, a prática do discernimento; pelo meio do mês, quem sabe, a filtragem dos fatos da vida; no último uma tomada de fôlego, arando o momento que antecede as ações seguintes.

Outros dias se repetirão, pois tem sido assim.

Neste dia o sabor compara-se a um assovio caduco passeando à esmo
na beira de um regato, pedindo intenções claras para saber pelo que no fim de contas clamas baixinho, se pela saúde e o sucesso, se pelo resgate de si mesmo, pela loteria de uma cama confortável e a proteção dos queridos, por um arco íris eterno desde já até o fim dos teus dias que não tem fim.

Nesse mesmo instante no mundo todo faz-se uma corrente pelo amor à paz que acabará com a guerra, ao propiciar a paz no âmago de cada elo que insta. Reza essa trupe anônima para dizimar o sistema de quebra, a aflição sobre o que vai acontecer, para extirpar o estado de alerta emocional que arranca o ser do fluxo. E sibilam esses sequazes pelo globo, sempre no mesmo horário, a reza que volteia e solicita - quase como o balouço de um anu-preto num fio elétrico - pelo nascimento do Jardim Mágico do Entusiasmo Sereno em cada veia que pulsa, dizendo numa só intenção visando mais sublinhar do que alertar, que a "Mente sobre a matéria é a mente do ego".


(Imagem: Autumn Woods by Albert Bierstadt)

 
Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 01/02/2015
Reeditado em 18/08/2020
Código do texto: T5122607
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