Precata véia

Um sertanejo de muitos anos

Caminha pela estrada

Com o chapéu aba larga e suor no rosto

Tem nos lábios o pito de paia.

Dentes estragados e muitas rugas

Tudo é sinal de luta e busca

Ele anda apressado com roupas rudes de algodão

Para chegar ao seu rancho de sapé beira chão.

O rancho é simples e cheira a sapé velho

Um pote de barro contem água fria

Na prateleira pobre estão as latas

Dentro delas carne com gordura, farinha e doce.

O sertanejo senta no banquinho de pau

Enrola o fumo cortado na palha de milho do paió.

Bate a lima na pedra e a isca pega fogo

Apoja no seu pito e bafora fumaçadas de paixão.

Ele contempla a cumeeira do rancho betumada de picumã

Dentro a mulher parideira com seus muitos filhos

Um cachorro velho com bernes espera esquálido pela comida

Os porcos lameados dormem debaixo da mangueira

Aquele é o mundo do velho sertanejo

O fogão no girau é barreado de branco com argila da vereda

Acima do fogão muitas coisas estão penduradas

Carne seca, lingüiça e o fel da última vaca morta

A panela preta de barro se esquenta com a lenha que queima

Os meninos barrigudos e quase pelados correm de um lado a outro

Alguns anêmicos e magricelos comem pequenos torrões de terra

A mãe os obrigam a tomar gotas de creolina no café pra matar lombrigas

O mundo é mítico e a supertição é grande, Dona Chandoca é a benzedeira

O sertanejo é gente pura e de grande sofrimento

Canta moda caipira e têm muitos cumpadis

A fé singela se traduz em rezas pra chover e também pra estiar

Parece ver Deus muito perto de si e nas simples coisas da vida

Quem quiser saber como é ser sertanejo uma coisa tem que saber

Ser humilde e preparado para o sofrer

Isso só não basta pois precisa outra coisa fazer

Andar três dias de precata veia sem padecer.

Adair José Guimarães
Enviado por Adair José Guimarães em 11/06/2007
Código do texto: T521985