DESEJO SECRETO

Deixar de existir, não penso a sério ainda sobre esse fato consumado.
Não pretendo entrar por agora nessa confraria fechada!
O que pode vir depois? Não me interessa;
Contento-me com a velha árvore de flores frondosas e suas folhas que refletem o clarão da lua na noite escura e estrelada do cerrado; Isto me interessa mais do que o que  ocorrerá depois da morte.
Mas por falar em fim...
Não é verdade que tudo que nasce um dia morre. Por que então eu também não haveria de perecer?
Se algum dia no futuro mais que futuro  haverá o apagão do sol e a sombra se instalará de vez levando a morte a todo  sistema solar; 
Ou pior: poderemos nos auto extinguir através de uma catástrofe friamente calculada por homens ensandecidos;
Ou de súbito sermos destruídos por uma corpo celeste que do nada adentre na atmosfera terrestre;
Ou  quem  sabe num ato voluntário de coragem, covardia, ou de desespero,  poderia também dar fim a vida, porque não?
Mas pior é estar morto em vida! Viver num país onde quase todos estão condenados a morte em  vida; A cidadania aqui não existe!
Entretanto uso dessa máxima como verdade a priori: que nenhuma inquietação existencial me tire à alegria das coisas amiúde;
Tenho um sentimento ambivalente de contentação e inquietação de saber que o absurdo de existir terá um fim num dia qualquer no futuro próximo ou distante;
Ah, desejar prolongar a vida - deixe que a morte chegue de mansinho [confesso que nutro um desejo de um dia morrer quando já estiver cansado de mim mesmo, quando não houver mais interesse nos mistérios e nas coisas do mundo ou quando meu corpo apresentar sinais de fadiga, quando não tiver como andar com as minhas próprias pernas e usar minhas mãos e minha mente; quando alguma prótese mecânica instalada em meu  corpo me aborreçer - e desperte o desejo de morte].
Não, não trato o mundo com deboche, todo dia agradeço a Deus  pelo fato de estar vivo,  minha insatisfação para com mundo  é minha maneira de estar nele.
Não sou um pessimista, não enquanto tiver minha mulher, meus gatos, minha cadela Brida,  e os pássaros cantando para mim,  meus cactos em vasos bem postos em  minha janela, com as flores e seus encantos, ou ver o por do sol e maravilhar-me com os encantos da noite, ou com a chuva que cai como cristais raros,   finos e  preciosos; ou tomar um açaí na tigela com aquele seu sabor de terra fresca.
Ou beber  um café pela manhã e sentir a energia do dia;
Ou, quando sentir um vento suave alisar as minhas costas;
E enquanto houver algum ser humano que me compreenda [já encontrei alguns] já me dou por satisfeito!
Não sou infeliz, estou na média: nem mais nem menos do que os demais seres humanos.
Crença num retorno a vida? A vida se movendo em círculos nos arrancando do tempo e nos trazendo de volta - eterno retorno? Ainda assim seria absurda! Qual o sentido disto sem que a memória do meu eu anterior me conectasse ao meu eu atual? Não seria mais eu, mas outro;
De outro lado se o eterno retorno nos trouxesse a vida novamente e com ela nossa memória passada seria uma condenação [que tedioso saber que serei eu eternamente]
A verdade é que existimos, mas um dia desejamos secretamente morrer.

Não porque a morte seja o remédio aos males da existência
Mas porque ela é o ato final é o destino natural dos que vivem;
Por mais que queiramos e ansiamos alongar a vida. 
 
Labareda
Enviado por Labareda em 09/06/2015
Reeditado em 12/03/2016
Código do texto: T5271490
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