Sem explicitude

Escrevo-te sem saber o sentido que minhas palavras querem assumir. Se querem ser flor ou perfume, se querem se agrupar ou permanecer sós, no esforço de dizerem o que são, sem acréscimos ou contextos. Palavras nuas, sem a desintegração das sílabas. Não sei se querem improvisar ou ensaiar o coro do espanto por um futuro desconhecido, que nada sabe sobre o amor ou qualquer outro sentimento. O amor não conhece o futuro. Nada sabe sobre acordar no dia seguinte. Respira apenas o instante, como as rosas que me olham alimentadas do que veem, sem anúncio de vida ou morte. Apenas são. Minhas palavras são apenas um exercício de vida, um alongamento na musculatura rígida do silêncio. Minhas palavras querem chegar, não se sabe onde. Porque quando as envio não sei aonde vão, não conheço quem as acolhe, não sei quanto delas se perde na longa travessia. Minhas palavras não são explícitas em suas intenções. Nem eu mesmo as conheço. São apenas as companhias desta hora, atuando sobre esta inscrição que desconhece começo e fim.