afinando a seqüência

Cadê o desassossego que desafiava a última gota de bom senso do meu sangue a dar um salto no escuro sem saber em que andar está. Dias delicados vem pela frente, prevejo, antevejo, sentidos de manhãs mais ou menos amenas, previsíveis, tangíveis demais para eu ter que tergiversar. Vou estar do lado certo da rua por alguns dias, desviar dos becos, ser um bom profissional, acordar cedo, estudar bastante, retomar os clássicos, prestar atenção aos imperativos, engulir vitaminas, analgésicos, tirar a poeira dos discos, confabular com especialistas prosaicos e saber que andei errado, que estou errado, desse jeito assim verborrágico, repetindo vernáculos encabulados, tentando entender o que acontece comigo enquanto pondero à beira de um precipício emocional. E decidi que não pulo, mais uma vez fui covarde, escolhi a vida, agora é tarde, vamos ver no que vai dar. Arrumar as malas já era, vou curtir aqui mesmo a primavera, ou outra quimera quiçá. Tantas beiras de falésias, outra via passado, já pensei, já chorei, jurei me atirar. Mas é tanto céu, tanto mar, tanto buganvília para brotar que eu fico pensando se não seria bom descansar um pouco mais, esperar quem sabe o dia um dia vai desanuviar e você virá estrelar o papel principal nessa tragi-comédia enluarada que é a minha vida e que eu venho encenando só para mim mesmo há tantas temporadas; essa que vou modificando, jogando água, triscando sal de lágrimas e seqüências vão rolando e sonhos e outros ciclos vem chegando e o teto vai ficando menos denso, menos realista, mais simbolista se for o caso. Desse jeito, talvez, um dia meu texto venha até a se tornar uma prosa romântica. Serei capaz de ser piegas, fuleiro, sem densidades, oxímoros, agudas metáforas e outros blagues academicistas e me render a simplicidade de amar só com um olhar narcisista [pontue a contra-gosto]

Jan Morais
Enviado por Jan Morais em 03/10/2005
Reeditado em 18/07/2006
Código do texto: T56138