Poeta..poesia...inclinação...profissão...

Querido Amigo,

Li um comentário seu em um dos livros que folhei no último sábado e fiquei realmente a refletir sobre sua afirmação sobre o ofício de poetizar. Quão contundente sua afirmação de que só se pode considerar poeta aquele que tem a poesia como ofício e que sobre as palavras medita, se exercita... Diante de tão enfática afirmação cheguei finalmente a conclusão de que, realmente, não sou poeta, poetisa ou algo assim...

Confesso que não cheguei a escarafunchar nos dicionários o significado de poesia, poeta...Me abstive de tamanha empreitada, mas me coloquei a pensar que por certo você deve ter razão. Nunca efetivamente tive o atrevimento de me considerar uma poetiza. Na verdade, eu e a poesia tivemos rápidos encontros, mas eu a negava com todas as forças da minha alma. Meu pai, uma pessoa com pouca instrução formal, era letrado por inclinação e afeição. Comprava livros de poetas renomados de diversos períodos da literatura brasileira e portuguesa e vez outra versejava Camões, Manuel Bandeira e por aí eu seguia nos poemas de sua coleção de três livros de grandes poetas brasileiros.

O motivo de minha aversão à poesia estava na quantidade de rimas que ouvia...de sons que se casavam, de ideias nem sempre compreendidas pelo meu intelecto infantil e principalmente a aversão vinha da ideia de que a poesia retratava amores, amantes nem sempre felizes e da ideia de que as rimas retratavam o sofrimento de um amor malogrado. E quando procurava ler sobre a composição da poesia, ainda mais aversão eu tinha, porque falava em rimas ricas e em rimas pobres, em estrofes e trechos que o poeta deveria compor com maestria. Isto de certa forma me enlouquecia, porque, nas poucas tentativas que fiz de me aventurar na arte de poetizar só encontrei rimas pobretonas, e, até certo ponto, cafonas. Então, me desanimei. Decidi: poesia nunca e jamais!

Contudo, o tempo, senhor do nosso destino, não me fez perder a vontade e o desejo de escrever...Leitora voraz desde que aprendi a concatenar as sílabas, queria saber de tudo um pouco e lia...de filosofia a romances de cordel. Aprendia palavras novas e percebi que elas começaram a me acordar altas madrugadas para serem vomitadas no papel, desenhadas ao sabor das teclas das antigas máquinas de escrever e dos dedilhados do teclado atual. As palavras dormitavam em mim como que escondidas nas dobras dos lençóis e me vi em apuros: o que fazer com elas? Daí, nasceram textos, vez ou outra parecidos com poesias, com rimas ainda pobrezinhas recém nascidas de uma alma inquieta...Por outras, os dedos se agitavam e emergiam ideias até então pouco pensadas, algumas revelando leveza e introspecção e outras sem muita razão enlouquecidas manchavam a brancura do papel e teciam flutuações e mensagens de uma inusitada alegria e esperança...Pois é, eu sei, não me tornei escritora, apenas uma aprendiz. Não me dedico a arte de construir estrofes e rimas. Nem sequer tenho a pretensão de me arriscar em alguma outra definição para o que faço, além de um ensaio de uma aprendiz...de alguém que gosta de brincar com palavras sejam elas rimadas, cantadas, organizadas ou desorganizadas....

Não sou delas escrava, mas sinto que elas se agigantam dentro de mim e me pedem espaço para desenhar suas formas no papel trazendo imagens, descrevendo paisagens dentro e fora de mim mesma...E a elas obedeço...nem sempre com o capricho necessário, como provavelmente você diria que elas devem merecer quando alguém se propõe a ser um escritor...De um pensamento a outro fico pensando se a poesia não será algo que vai além de nós. Além de regras da construção ortográfica...Descobri que há pessoas que tem a poesia no olhar, no sorriso, na alma...e outros que tem a poesia na ponta do lápis, na ponta dos dedos do teclado de um computador... E algumas conseguem juntar as duas coisas e disso ganhar o pão que sustenta o corpo. Você era deste último tipo... Eu ainda ensaio os primeiros passos na direção da primeira versão...

Confesso que gostaria de ter a alma de poeta e a capacidade em poetizar como você bem o fez...Com certeza teremos outras conversas como esta, mas por hora devo aquietar-me e retomar os afazeres daquilo que hoje é meu ganha pão: cuidar das feridas do corpo...e quem sabe um dia, eu aprenderei a cuidar das feridas da alma...

Que a paz resplandeça em seu olhar de poeta e a inspiração das poesias e escritos que você deixou nos iluminem nessa breve caminhada pela vida...

Com amor...mas sem dor...me despeço....

Ana Izabel JS
Enviado por Ana Izabel JS em 11/05/2016
Reeditado em 12/05/2016
Código do texto: T5632346
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