Um olhar

UM OLHAR

Num olhar distante e vazio se perde a inocência de criança.

A vida é muitas vezes tão cruel para alguns, que a certeza da infelicidade se constrói no dia-dia...

Um olhar, triste e vazio em alguém, que desde cedo se depara com a difícil realidade da vida, com os problemas que terá que enfrentar ao longo dela, com a mediocridade do ser humano que se esqueceu do seu bem mais precioso, que é a vida, e que desvaloriza o verdadeiro sentido de vivê-la...

Foi o que vi quando comecei a selecionar as fotos que havia tirado em uma invasão, onde fui fazer a cobertura de um protesto de sem terras, na periferia de João pessoa. Impactante é a palavra mais apropriada para descrever tamanha falta de humanidade. No meio de muito tumulto, de gritos de indignação, de pessoas que reivindicam com direito, um mínimo de dignidade. Havia um olhar imperceptível, escondido, silenciado, esquecido e curioso com tudo que acontecia ao seu redor, sem muito entendimento participava sem querer e até por brincadeira, sem saber por que estava ali naquele momento. Vi quando comecei a selecionar as fotos um menino franzino, de cueca, sem sandalhas e com a mão na boca com um olhar vazio, triste desnorteadoe e desencantado.

Meu Deus! Aquele menino que aparentemente tem uns três anos estava ali, e aparecia em todas as fotos que eu tinha. Fiquei perplexa com aquela criança, desolada, sem lar, sem história e por muito tempo aquele olhar me perseguiu.

Como poderia uma criança naquela idade, naquele lugar, estava lá não sei com quem, quem eram seus pais, mas sei que a necessidade está lá e o acompanha em seu olhar.

A inquietude foi tão grande que não me contive e voltei naquele lugar, voltei naquele lugar para observa, aquele olhar, que profundamente me incomodava. Descobri que o menino era filho de uma das moradoras da invasão que estava ocupando um dos barracos. Era uma jovem mulher, negra, mãe solteira de três crianças e aguardava mais uma. Uma pessoa dócio, de vida comum, que estava ali não porque queria, mas porque era o melhor que poderia dar a seus filhos no momento.

Fiquei por ali, por alguns dias, fotografei outras crianças, conversei com outras mães de família e aproveitei todo esse material para compor o meu trabalho da faculdade. Percebi o quanto a vida para alguns é sofrida, são pessoas de bastante capacidade, mas que não são vistas, nem ouvidas, não por não chamarem a atenção ou por não saberem falar. No entanto é por não terem muito o que dá financeiramente falando, por estarem a margem, por não vestirem coisas boas, possuírem status e tudo aquilo que a sociedade valoriza.

Ah! esse olhar vazio, aquele olhar vazio e perdido em meio a desigualdade, a infelicidade e a incerteza de dias melhores estão por aí, na esquina, nas ruas, nas áreas menos assistidas, nas áreas de grande nobreza , bem pertinho de nós, mas não nos incomodam, porque não somos nós, não nos incomodam porque imaginamos que tem que ser assim...foi assim que Deus quis e tantas outras explicações que buscamos para maquiar a incapacidade do ser humano, de ser, de ser humano...Enquanto pensarmos e agirmos assim quantos momentos felizes vão dar lugar a fome, a violência e a tantos outros problemas que fazem parte dessa nossa sociedade?

Ah! olhar vazio, perdoe-me pelo que não faço, desde que te vi penso apenas em te dar um abraço, te acolher nos meus braços e não deixar espaço para tanto fracasso, te guardar como joia preciosa, te botar pra dormir num lugar quente e confortável, te fazer sonhar e te vê sendo feliz... com um brilho no olhar que procuro por aí e mudar o teu nome e assim te chamar de olhar feliz.

Driely xavier
Enviado por Driely xavier em 22/06/2016
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