Tal como era sua vida

Um ponto final no fim da frase,

E acabou.

Fora assim que a menina chorosa por dentro encerrou sua carta cheia de letras vazias.

A poesia tomou conta da cena, densa e sem vida.

Eram palavras rimadas de uma alma velha, pálida, enegrecida.

Cansada de ser a mesma pessoa,

Ela se despiu da velha casca uma vez mais,

Quem sabe para tentar,

Hora vez outra, desistir.

Um marinheiro parte sem rumo,

Em busca dessa coisa que ele mesmo se tornou,

E que hoje é bem maior que eu.

É um mundo assustadoramente molhado lá fora.

Mais cedo ou mais tarde,

Vamos todos afundar.

Envolva-me em seus braços, se puder nadar.

Com a menina fitando o tempo na varanda não era diferente,

Um punhado de vergonha e goladas de euforia.

É quase dia, e ela está sozinha.

Fico da plateia, todo esguio,

Observado o olhar tremulo da menina que não chora,

E que ainda assim deságua por dentro.

Litros e litros de tristeza e agonia.

No fundo ela tinha orgulho daquele monte de tecido e pele,

Fachada que era,

Para sustentar uma estrutura ruída, frágil e imbuída no marasmo de sua insossa rotina.

Não é que ela esteja quebrada nem nada,

Tornara-se uma montanha de roupa suja,

Cascas e camadas,

Dela mesma,

A tal menina.

E se retirarmos tudo aquilo?

O que sobra?

Um punhado de terra preta e nada mais.

Na parede um quadro estampa a nova melodia da tarde de verão:

O rosto de uma gardênia indefesa emoldurada em silicone e PVC,

A flor que antes só aspirava ser ela mesma,

Fora engolida pelo quadrado do mundo de plástico.

Onde ela vai chegar?

A menina mal sabe,

Mas não é que ela se canse de esperar,

Talvez nem se acabe...

Ou, quem sabe, o trem passe,

E tudo se acabe logo.

Como começou:

Um ponto final e um punhado de poesia,

Para preencher de nostalgia a cena vazia,

Opaca e sem brilho,

Tal como era sua vida.