O QUINTAL

Nem precisava fechar os olhos, para lembrar. Bastava um instante, e, ela estava naquele quintal de outrora. Em sua retina espiritual ele permanecia igual. Mesmo que há mais de quatro décadas, seus pés não pisassem aquele local.
O tempo nunca foi impecilho para ela visitar aquele antigo lugar, suas lembranças se sustentavam acima do tempo.
Usando sua forma incorpórea, ela sentou-se ao pé do velho poço, e ficou ali, quieta, ouvindo o ruído da corda puxando o balde, em poucos instantes a água surgiu fresca, límpida. Sem pressa pegou a velha caneca  branca de ágata, e sorveu um gole daquele líquido precioso. Ah, o gosto daquela água, nunca mais em sua vida bebeu outra, tão suave, e com temperatura mais agradável.
Ao seu redor, a quietude, somente era maculada, pelo roçar da brisa calma, que lhe acariciava a alma, ou o canto dos pássaros, que tanto quanto ela, adoravam visitar aquele quintal. Eles, pouco se importavam com o velho espantalho que o avô, um dia colocou, bem no meio do canteiro de verduras, na tentativa vã, de  conter o ataque das aves, e poupar os brotos tenros que rompiam do seio da terra, em busca da luz. Vez ou outra, o perfume das dálias, de todas as cores, besuntavam-lhe a alma, e encantavam-lhe o olhar, essas belas flores, eram as preferidas do avô, e a avó vivia a reclamar, com ele, o porque de tanta cor num só canteiro. A alma riu dessas doces lembranças, e chorou, com vontade de os abraçar bem apertado, e lhes confessar, mais uma vez, que os melhores anos de sua vida, havia passado ali, naquele singelo quintal, naquela modesta casa. Em seguida, secou o pranto, e se perguntou: como uma alma tão pequena, encontrou lugar para guardar tantas reminiscências e saudade?




(imagem: Lenapena - Dumbo/NY)
Lenapena
Enviado por Lenapena em 21/08/2016
Reeditado em 21/08/2016
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