Primavera

A primavera chega, e o sol em libra começa a brilhar mais forte. Flores reverenciam a paisagem e eu não sei chorar. Meu coração grita, mas não se pode ouvir um coração fraco assim. E numa contradição de mim ele bate forte como boxeador. Eu não sei chorar, embora more aqui uma angústia preta e branca. É primavera, e você empalidece. Tudo bem você ter seus espinhos, eu também tenho meu ferrão. Porém eu preciso do seu pólen para fazer o mel. Que terrenos tu pisas, que ainda não esqueceu o caminho de vinda? Esqueça! Não há como voltar, os passarinhos comeram as migalhas que ficaram no caminho. Se perca, e deixe-me te achar! Serei abelha, e você flor. Se preciso for me faço beija-flor, só para te beijar e beijar e beijar. Floresça e ponha cor no teu mundo.

Eu já temo o que o futuro te reserva: outro alguém. Eu não fui capaz de te tirar do passado, esse espelho de lembranças más. E agora, depois de me alimentar de ti, também estou envenenado. Você ama quem não te ama, e eu te amo... Maldita quadrilha de Drummond! Você, flor venenosa, me pôs tonto, estou nas nuvens. Não sei chorar, e preciso desatar esse nó que me sufoca. Preciso fugir dessa paisagem que achei que fosse um lago e é mangue; desse rio que corre para trás; desse terreno de areia movediça que me prende e me entristece.

Você está murchando, logo agora que chegou sua hora. Não morra! Mas também não suportarei você reviver se outro alguém quiser te regar. Serei então morcego, e o mundo ficará de cabeça para baixo, a noite virará dia, o sonho pesadelo. Eu te daria uma tempestade se preciso fosse só para te florescer, te dar o arco-íris, o horizonte e paisagens onde Deus sorri. Mas não sou capaz de te fazer esquecer quem ainda tem seu coração nas mãos. Essa mornidão não te aquece como o fervura de outrem que te deixou em brasas, cinza. Espero, então, que a primavera se vá, e o verão trará novas cores, e as flores serão apenas para os buquês de casamento e para enfeitar gente morta. E no outono, talvez, tudo se renove para mim, e eu encontre naquela folha que se recusa a cair com o vento, que se deleita com o sol brando, assim serenamente quem seja capaz de dançar no meu ritmo e cantar no meu tom. E, então, eu finalmente mudarei meu jeito de pensar: eu tenho muita sorte no amor. Foi bom você não me querer! Foi bom eu não chorar, e você não florescer com minhas lágrimas a te regar. E enfim serei águia, livre para voar ao lado de quem saiba que o passado mora no presente, mas só é possível amar no presente...