Quis voar (a Ana Cristina Cesar)
Talvez eu não quisesse que ele soubesse que eu era eu.
E eu era.
(Caio Fernando Abreu)
Fui subindo, subindo... Subi ao 12º andar
Para, naquele estreito apartamento
Me encontrar com o ausente.
Sabia que ele não estaria.
Mas precisava, ir não vê-lo
E, esse “não-encontro” encheu-me de vida!
Nesse pequeno apartamento...
Cravada na madeira do balcão da cozinha
Estava a pista que me dizia:
“Os mortos não adoecem”
E uma seta que apontava para a janela da sala
Dela, se via a cidade limpa, linda e iluminada.
Vista assim, do alto, parecia proteger quem nela se refugiou
Eu não via seu lixo, não sentia sua podridão, não ouvia suas dores.
Mas, quem lá de baixo olhava para o alto sabia...
Sabia que, nela, só há podridão.
Lixo, dores, perdas e todas as mazelas d’ uma corrupção visceral!
Ali, do alto, me senti solitário e protegido.
Protegido das ruas, deles, da chuva.
Abandonado dos vícios, quis voar!
Decifrei o enigma...
Me petrifiquei!
*Ana Cristina Cesar 02/06/1952 – 29/10/1983.
**Caio Fernando Abreu 12/09/1948 – 25/02/1996.