Desse tal de amor tranquilo

A rua é lugar de encontro, lugar de partida, lugar de amar. É na rua que andamos ao lado, que olhamos na mesma direção, que seguimos o mesmo caminho. Saber isso intelectualmente é até fácil, mas no dia a dia, na correria, parece tão distante. Até que você chega. E o encontro se dá. E essa coisa de amor tranquilo (que você jurava que não existia) surge. Seu coração fica quente, macio, calmo, e você segue ao lado. E vai. E secretamente pede aos deuses (que nem acredita que existam de fato) que a rua não tenha fim. E que não acabe nunca aquele encontro, aquele seguir.

Se deixa de olhar à frente e espreita a alma ao seu lado, vê sorriso e encanto. E se encanta mais. E mais. Partilhar esse olhar, essa andança, essa caminhada, traz plenitude. E que bom que é assim. “Vamos aqui pelo meio, pra você sentir, ver como é”. E os homens preocupados em fazer sentir tesão, prazer, paixão, sei lá o que, enquanto aquele moço ali, me dizendo pra sentir a praça. O reconhecimento da minha capacidade de sentir me encanta. E eu entro na praça e sinto. Sinto a mágica toda ainda hoje, só fechar os olhos. E é das mágicas que vão seguir comigo, me constituindo, porque em algum lugar tem um amor tranquilo que reconhece em mim essa capacidade toda de sentir.

E cada pedra, cada lixeira, cada árvore tem uma história. Ouvir cada uma, sonhar outras tantas e seguir. E confiar que vai ser assim e também que vai mudar. Confiar em cada história partilhada, no que vem antes das palavras, no que é calmo, tranquilo, sereno. E depois não ter medo do que desequilibra, do que engana, do que erra. Esse amor na base de tudo que o outro faz deve ser esse tal amor tranquilo. E que bom que é assim. E que bom que a vida pode ser uma grande rua onde a gente se encontra, parte, se vê de novo, e se ama.