Chuva Rubra

Já há chuva no horizonte...

Nenhum arco-íris nos espreita.

Nenhum baú de ilusão nos espera.

Tudo é açoitado à nossa fronte,

como um torto que à sombra ajeita

e ao espelho perfeito se desespera.

Já há chuva no horizonte...

E nenhuma gota se aproveita.

Nenhum balde, nenhuma cisterna,

nenhum tanque, nenhum hitrante.

Nada provê a fome estreita,

nada seca a lágrima consterna.

Já há chuva no horizonte...

Pinta de rubro nossa terra

antes de fechar nossas gargantas.

Antes contaminar a fonte.

Mas que porteira não emperra,

em gentes que se acha infantas?

Já há chuva no horizonte...

Que se embebam os lençois.

Que se lancem as garrafas.

E o mar triste como antes,

Este sol dobrando raios em nós,

Sertão vive sem tarrafas?

E sem chuva em qualquer lugar,

E sem trégua a qualquer labor,

Em qual corpo se vai a ternura?

N'alguma parte há que descansar.

Não há torque em seu motor

que vença essa distância bruta.