Rotina

ROTINA

O jarro na mesa já não complementa as dimensões do meu estar. Salienta que, naquele espaço, há um objeto. Veleja na sua inerte fantasia de ser parte de um ambiente cercado de pessoas que o olham e admiram. Pessoas que tocam as flores e sente o perfume, mas não importa em regá-las. As mesmas que, no descuido, pode cometer um ato fervoroso: quebrá-lo.

A mesa também vive para complementar um cenário, uma redoma criada para ser o grande casulo de uma libélula esperando a metamorfose. Vida de degredos. Vida de desatinos... Muitas vezes, as coisas existem somente para fazerem parte da vida das pessoas. Muitas vezes, essas mesmas coisas, num ato de lucidez ou de pura insanidade, se mostram tristes e com vontade de mudar. Mudar que talvez não faça parte da vida de todas as coisas. Mas, muitas coisas precisam ser mudadas. Até para que o cenário já não continue sendo o mesmo. Para que o tédio não ilumine com sua penumbra fúnebre a vida.

Nessa rotina deserta e prosaica, a cama aguarda silenciosa a minha chegada todos os dias. Algumas vezes eu percebo sua tristeza. Ela se encontra fria e não se ver na simples obrigação de acalentar um corpo melancólico que ali se joga, bem no fundo do poço. Num sono profundo, rolando de um lado a outro, sonhando, eu tento acordar de um pesadelo. E então, um cortejo funesto caminha em lentos passos e levando consigo a lúdica alegria da minha vida deixa como resquícios de um fim: lembranças passadas.

Na companhia mais próxima do travesseiro, relato-lhe os segredos e os desejos que inflam meu coração. Segredos que alude uma pergunta. Pergunta que continua a martelar em meus ouvidos aguçados em todos os instantes que pressinto que desejo: um momento presente em ti.

Gostaria que, pelo menos uma abelhinha pousasse naquelas flores que agora se encontra parada dentro daquele jarro. Inerte sobre a mesa... Gostaria que em meio a todos os instantes que a vida me oferece, um beija-flor soprasse o vento leve rumo àquelas flores e, em sua despedida, soltasse um assovio de felicidades.

Mas, eu permaneço constante na sensação fortuita de está vivendo um momento. Um momento infinito, talvez. Apenas um assovio! Apenas um anseio e se alegrarão para que a vida mude num alento. Depende apenas do meu ser, que agora levanta na certeza de caminhar sob os raios agudos de um novo sol.

CALIXTO
Enviado por CALIXTO em 17/08/2007
Código do texto: T611735
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