UM MUNDO DE GELO

Ainda era dia de San Valentim e casais pareciam comemorar o dia dos namorados, baillando numa superfície gelada em Pyeong Chang, nos Jogos Olímpicos de Inverno. Misto de força e fragilidade. Espetáculo de beleza e persistência.  E, claro, muitos ensinamentos para a vida toda. Como a lição que a patinadora alemã Aliona Savchenko deu ao vivo para todos que acompanharam sua saga em busca da medalha de ouro que chegou na sua quinta e última olimpíada. Atleta mais velha, por vezes injustiçada, até desacreditada.  Nada disso, porém, impediu que ela perseguisse seu sonho dourado com a persistência natural de quem vive num mundo de gelo, totalmente diverso desse mundo solar e aquecido em que vivemos. Foi impossível não recordar os vilarejos montanhosos e cobertos de neve que visitei no Canadá. Lugares como Whistler BlackComb e Grouse Mountain . O frio por si, nos torna introspectivos, imagine alguém como eu pura introspecção, ruminação  e excitação mental. No frio, de chuva intermitente e ventos uivantes, meu corpo estava entregue à contemplação. E foi com esse olhar que me encontrei com a neve. E como uma criança na fase oral, cheirei, comi, pulei sobre ela, rolei, brinquei de todas as maneiras possíveis para mim. Só depois, muito tempo depois, frui do silêncio que um mundo branco e frio pode oferecer. Um abismo sem abismo. A solidão materializada numa imensidão láctea. Imaginei - me perdida por ali, ou me deparando com os dois ursos que lá habitam, se num distúrbio do sono, eles deixassem a hibernação antes da hora. Propositadamente, me deixei ficar para trás, distante do grupo, só para realizar o fetiche de andar sozinha sob as copas das árvores cobertas de neve. Sonho antigo e bizarro que me persegue desde a infância. Senti - me em paz. Renovei minha crença em Deus e minha admiração pelo ser humano. Vi homens quebrando o frio com seus narizes aduncos e vermelhos para ir ao trabalho ou  forjando beleza e diversão em meio à adversidade. Pistas de patinação, snowboard, esqui, hóquei, biatlo, skeleton, luge, bobsled, curling e o combinado nórdico. Crianças miúdas aprendendo a sobreviver diante de uma natureza gigantesca e inóspita. Foi assim que chegamos até aqui, acreditando no poder da nossa vontade, do nosso querer. Foi isso que a neve me ensinou e Aliona Savchenko comprovou em saltos e incríveis piruetas: Nós podemos tudo quando queremos de verdade.

Adelaide Paula
Enviado por Adelaide Paula em 15/02/2018
Reeditado em 15/02/2018
Código do texto: T6254267
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