FAÇA UM BOLO PARA MIM
Estou contando as idades que colhi,
As idades que fiz, as que tenho e as que terei
Calculo cada passo que dei para chegar a cada idade
Sinto um começo novo a cada ida de cada idade minha
Sinto um vento novo a cada vento que venta meus ventos novos
Eu afinal sou uma criança!
Uma criança velha,
Uma criança nova,
Uma das mais novas pessoas velhas do mundo!
Reúno cada idade minha
Para saber quantos de mim somos eu
Sou muito dos humanos que vivem suas vidas
E vidas alheias
Vivemos um pouco, e devagar
Pois quando formos morrer, só será uma vez
Tão rápido como a luz.
Faça um bolo para mim, mãe!
Hoje vou nascer aqui, e aqui comerei
E aqui beberei
Pois aqui tenho minha mãe, a confeiteira dos bolos meus, e pães
Não sei onde hei de nascer amanhã, se nascerei mesmo
E se serei mesmo uma criança, ou a mesma criança de sempre
Faça-me saber como se faz o bolo que como agora, porque sabe tão!
Ensina-me os bolos,
O café,
Aquele vinho, mãe.
Ensina-me até a água, mãe, como devo bebe-la
Não sei ao certo como serei da próxima vez que nascer
Se poderei comer,
Se poderei beber,
Mas sei que poderei nascer,
Pois isso não se aprende, se ensina!
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Meus grisalhos cabelos
Envenenam minhas afeições com rostos novos a cada esquina que faço
Os passos estão menos longos e mais lógicos,
Ando mais destemido e menos vaidoso
Ando para não ter vaidade,
Ando uma rapidez tão ávida como meu vagaroso ser,
E neste meu vagar, viu-me vagueando a morena lá do bairro
E gritou de fininho um assobio baixinho
Chamando-me para ela,
E fui para lá, e fui para ela,
Morena que ela era, tão bela que só ela….
-Empresto-te meu amor, devolva-me quando puderes
Dizia ela ela para mim.
Ela se chamava Ana
Um dia nossos amores cresceram,
E fizeram-se maduros,
E com eles fizemos amores,
Eu e aquela morena
Aquela morena e eu
Faça um bolo para mim, mulher!
Ontem quando fui para o ofício,
Comeram minha fome sem poder mata-la,
Comeram meu desejo de ser grande, minha vontade de voltar
Comeram tudo, e comeram sozinhos, sem deixar nada
Disseram que um kakinhento chega para o nosso jantar, me deram de subsídio,
Mas de qual natal, se Dandara ainda não nasceu?
De quais férias se eu nunca fui a nenhum lugar senão no trabalho?
Faça mesmo assim, mulher
Dizem que onde comem cinco, cinco mais podem beber
O estendal era mais caduco que os cabelos de Ana
Mas dava para deixar a bamba seus pensamentos resmungar
Não se sabia ao certo o que ela resmungava
Se dos seus lençóis que clamavam por novos
Se dos seu pés inchados de uma gestação
Ou ainda do fim do mês que se recusava a chegar cedo
E lá se foram nove vezes
Sete dias vezes quatro
E Dandara nasceu
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Calcorreou sua inocência, quando aos cinco cresceu
Chorou suas alegrias quando quinze se deu por moça
Reviveu nossas histórias, e contou as suas
A passos dela e abraços nossos, meus e de Ana, e nossos
Dandara virou mulher
Mas sempre filha
Hoje me vejo balançando meu velho ser
Sobre uma cadeira velha, olhando para o lado
Com um olhar tão perto quanto distante
Um olhar que diz tudo falando apenas nada
Estava olhando para aquela antiga morena lá do bairro,
Estava olhando para Ana
Memórias me formigavam a alma,
Quando ouvi minha própria voz
Cansada e velha enrugada e seca tentando gritar assim;
-Faça um bolo para mim, Dandara!
overdoSe O welwianO
Luanda 07h03pm ter 29/08/2017