As minhas doces lembranças...

Naquelas tardes, cujas lembranças já vão um tanto assim esmaecidas em minha memória, imagens fragmentadas trazem-me ainda a ternura e a inocência daqueles momentos de ouro para a formação do caráter e sedimentação da minha personalidade, enquanto fortes e claras permanecem, perfeitamente gravadas em meu inconsciente, as lições ali aprendidas e jamais esquecidas... Eram tarefas simples, hoje sei, mas de cabal importância na vida daqueles dois meninos, o Acir e o Luiz Carlos que, aos nove e sete anos de idade, nos esforçávamos muito acima das nossas forças para cortar a lenha, limpar as calçadas, o jardim e outras pequenas tarefas que nos eram confiadas... Sabe com qual forma de pagamento diário? Ora, ora, ora, que lindinhos ficávamos ali, na parte de fora da janela... A casa era do bondoso casal, o seo Gentil e a dona Aurora, ali na rua Quinze de Novembro, próximo ao Santuário de São Benedito, na Lapa... Onde, então, ali podíamos ficar assistindo televisão todas as tardes, após as nossas árduas mas voluntariosas tarefas...

Televisão... Ah, a televisão! Para nós aquilo era coisa de milionário, ora se era...

Mas o importante, importantíssimo mesmo, foi que muito ali aprendemos - Aprendemos para a vida, e nos divertimos com os filmes do Fantasma, do Tonto, do Bonanza... Ah, e também todos os gibis dessa turma toda, na nossa infância... E não é que até o Cavaleiro Negro e o Tio Patinhas - com toda a sua avareza, mais o Pato Donald, com os seus sobrinhos peraltas, e a cobiçada Margarida, etc, etc, etc, todos viviam entre nós, assim quaaase literalmente? Outro dia ainda, e contarei as nossas aventuras como pequenos serventes de pedreiro... Também as "outras" aventuras, essas um tantinho picantes, no majestoso Cine Glória! Então já adolescentes e pra lá de conquistadores, pois não é que as lapeaninhas não ficavam em nada a dever para as cocotinhas com as quais sonhávamos em frente da televisão? Gente!...

Gente querida, que têm paciência comigo! Que tal seria meditarmos nisto: ...E saber que hoje, com tantas leis hipócritas em vigor, criadas no interesse maior justamente de quem as cria...

As crianças de hoje em dia só podem ir para a escola, e comer merenda superfaturada e não poucas vezes estragada, para logo em seguida começarem a ser "empurradas" para as séries seguintes - Que assim as autoridades ficam "de bem" com os organismos internacionais e blá, blá, blá... Para logo em seguida, pré-adolescentes, serem novamente empurradas, desta vez para as esquinas da vida... Visto ser terminantemente proibido aos pais ensinarem as suas crianças a trabalharem... - Onde ali, nessas drogaditas e malditas esquinas, efetivamente as crianças de hoje em dia aprendem... Aprendem a morrer sem um só fio de cabelo branco na cabeça, em troca de molestar e tirar o que puderem dos outros? Os cães de rua, esses também morrem e molestam as pessoas pobres nos terminais de ônibus e nas calçadas, enquanto tentam sobreviver "largados" nas ruas, tal as crianças, também por força dessas "estranhas" leis... Embora esses ainda recebam aqui e ali esparsos gestos de carinho de alguns "humanos", enquanto as crianças que perambulam pelas mesmas ruas, assim da mesma forma por força e obra dessas "leis modernas", quase nunca nem isso, o carinho dos transeuntes recebem... E saber que tais criaturinhas, assim empurradas para as ruas, são apenas e tão somente o visível efeito de causas quase sempre corruptas, mas nada sociais?...Triste, muito triste ver como os governantes tomam as vezes dos pais e brincam de educar crianças, que já não são mais crianças, desde que deixam as maternidades dos "mães curitibanas da vida", onde o público alvo - Sem sombra de dúvidas, são as mamães adolescentes... E lembrar que naqueles nossos tempos de criança, as "bonecas" das meninas eram bonecas de verdade, enquanto as de hoje são bonequinhas de carne e osso, e de sangue e lágrimas de abandono... Abandono pela ausência do pai (quando sabem quem é...) e muitas vezes até pela ausência da mãe, tão logo nascem... Ah, não fora o amor filtrado no sacrifício de tantos e tantos vovôs e vovós, esses que nem mesmo respeitados comumente são por essa geração que aí está nas ruas e vielas da vida... Esses que desdobram os seus minguados orçamentos domésticos para manter a família, que assim nunca diminui em termos de despesas, mas só faz aumentar e aumentar a cada "cria" que as suas filhas - e filhos também, arranjam nas ruas... E nem quero pensar qual seria o destino da imensa maioria dessas criancinhas... Ai, ai, ai! E a maioria, frios, indiferentes e egoístas ao extremo, continuam a torcer o nariz, enquanto tudo isso seja com os "outros"......Ah, minha gente!

Puxa vida... Perdoem a minha divagação, que nem sou escritor, mas mero cidadão.

Mas, voltando ao eixo da prosa... Eta! Que infância boa que eu vivi, ali na Lapa...Tá certo que um bom tanto, pela ajuda dos vizinhos, e do seo Osmário, e da dona Noeli, e do seo Benedito, e do Lourival, e da padeirada toda, e do seo Juca Racheski e... e... e...

Mas, principalmente, pela varinha mágica!...

...Ou seria uma temida, mas abençoada varinha de marmelo?!...

...A varinha de ordens e obediências da sofrida mas nunca distante mãe Chica, essa nossa amada heroína, de saudosa e preciosíssima memória... Até mesmo a dona Ditinha, então nossa querida e bondosa vizinha e esposa do durão, mas correto Sargento Perússulo, ouvia os seus abençoados estalidos, de vez em quase diariamente, he, he, he!!!

Armeniz Müller.

...O arrazoador poético.