NATAL E AS LEMBRANÇAS DA INFÂNCIA

É Natal!

Vai chegando a noite e meu coração se enche de saudades!

Fecho os olhos e me deparo com as lembranças da infância!

Entro no apartamento, de mansinho... todos dormem.

A sala está escura. Através da porta de venezianas, da sacada, a luz da lua flui iluminando meus passos. Volto no tempo... são longos os anos e enorme a saudade!

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Faz dias o pai comprou o pinheiro – uma árvore frondosa que ia quase até o teto, plantou numa lata e a decorou com saia de papel crepom.

Esse ritual era dele, que talvez assim o fizesse em nome dos sonhos de menino pobre. Da vontade de ter uma Árvore de Natal.

Menino criado em "sacos de funcho", como ele afirmava, não tinha lembranças de muitos brinquedos. Suas recordações cresceram em meio aos sabugos de milho que podiam ser tudo, bastava deixar fluir a imaginação.

Ali, no canto da sala, o pinheiro de Natal permitia sonhos, acalentava a infância. Muitas bolas coloridas, anjinhos e cordões dourados, velas e flocos de algodão. Era o jeito que meu pai tinha de resgatar o passado.

E a ESTRELA! Lá, no topo, brilhava a Estrela de Natal!

As delicadas bolinhas e a estrela eram de vidro, tão frágeis na sua transparência. O vidro tinha detalhes pintados à moda antiga, com carinhas de Papai Noel, anjinhos e trenós. Contidas em caixas de papelão, embrulhadas em papel de seda permaneciam todo o ano aguardando.

Pelas mãos de minha mãe eram ofertadas com delicadeza, para que as crianças pudessem auxiliar a enfeitar a árvore. Cada um de nós alcançava a sua contribuição ao pai para que as colocasse nos galhos do pinheiro.

As delicadas velas vermelhas eram contidas por pequenos candelabros de latão azinhavrado. Os anjinhos e os festões multicores se aninhavam nos galhos do pinheiro.

E no centro dos galhos um cartão que o pai recebera, há muitos anos, de um amigo. Um amigo querido que já se fora e do qual o pai guardava gratas recordações. Era uma homenagem que o pai fazia ao amigo que partira prematuramente.

Quando me contava suas recordações o pai me falava de como se estabelece a amizade, do bem que nos faz, do quanto é importante preservarmos as boas lembranças.

E a árvore ficava tão linda!

Por suas cores, por seus significados, pelo carinho e capricho com que era montada a cada ano. Sob a árvore um pequeno presépio. E pacotes, sacolinhas e as cartinhas com os pedidos.

E assim se passava o mês de Dezembro!

A roupa vermelha precisava ser arejada e dava trabalho à mãe pendurá-la ao sereno e retirá-la antes que a gurizada acordasse.

Éramos todos tão pequenos, mas espertos e por certo descobriríamos o segredo dos meus pais. Se descobríssemos a roupa no varal perceberíamos quem era, afinal, o Noel que nos visitava.

Nosso "Noel" era magro e precisava de um travesseiro para preencher a tradição! Eu mesma, a mais velha da turminha, já andava desconfiada que Papai Noel teria encarregado o pai de entregar nossos presentes. E foram tantos e significativos, ao longo da infância.

Não tínhamos luxo, tudo era simples, mas ofertado com amor: bonecas, jogos e cavalinhos, caminhões, bolas e panelinhas. Alegria das meninas daquele tempo, a "cozinha-americana" - último lançamento - de metal branco, com armários de várias portinhas.

A lousa, os giz em cores, os blocos. A aquarela e os cadernos de pintura já preparavam para o ano escolar.

O jogo de mesa e três cadeiras, de madeira verde, em tamanho infantil. Uma para cada menina - com corações recortados nos encostos. Para que brincassem comportadas enquanto a mãe trabalhava.

E a mãe em tratativas e preparos: bolachinhas de Natal podiam ser pinheirinhos, casinhas, bonecas. E os doces que ela inventava, sem receita prévia. Era uma alquimista, sempre atenta, sempre positiva e risonha.

Tanto trabalho, tantas expectativas... faz tanto tempo!

Nada era mais importante que o prazer estampado nos rostinhos que recebiam presentes das mãos do Noel, que os retirava da grande sacola vermelha.

- Mas... "cadê" o pai? Onde estava meu pai nessa hora? Que estranho!

Ano após ano, as crianças iam percebendo que na chegada de Noel o "seu" Álvaro nunca estava na sala, mas que voltava ligeiro quando Noel se despedia. Dona Iris tinha uma desculpa esfarrapada: - O pai está cuidando do trenó, lá na calçada.

E nos dizia isso com a maior naturalidade... vai ver, em seus sonhos de menina, havia um trenó verdadeiro, brilhante e cheio de sinos que tocavam em sua mente enquanto promovia a alegria das crianças.

As crianças: a Haydée tinha medo da barba do Papai Noel, a Lena ficava quietinha com seus olhos azuis encantados pelas surpresas, o Mário Antônio, tão pequeno e muito curioso, queria saber das novidades. A Mara Inez, atenta, tentava adivinhar os mistérios do Natal. Tão pequeninos, tão inocentes... faz tanto tempo!

Seu Álvaro e Dona Iris, exemplos para acalentar o Natal! O tempo, insopitavelmente redivivo nas lembranças!

Coube a cada um de nós exercer, a seu modo, a tradição e transmiti-la. Assim, muitas foram as árvores que montamos para os nossos pequenos, tantos presentes, tanta expectativa.

Aos pés da Árvore de Natal os aviões dos Comandos em Ação, He-Man e o Esqueleto, Tartarugas Ninjas, Play Mobil, Legos em profusão. Bicicletas, Skates e Barbies.

Nossas crianças cresceram. E, nem demorou muito, o Natal foi iluminada pela presença e o riso de outras crianças.

É pra elas, as crianças de ontem e de hoje que eu dedico essas lembranças de Natal. Para que saibam sobre o espírito de Natal, para que conheçam sobre amor e dedicação. Recordações são presentes que o tempo não muda. Não perdem as cores, pelo contrário!

E o brilho da Estrela, no topo da árvore, permanece nos corações!

Ao Seu Álvaro e Dona Iris, onde estiverem, eu desejo FELIZ NATAL!

Para as crianças de ontem e de hoje: meus irmãos e seus filhos e netos, para os meus filhos e, especialmente, para minha neta Isadora, pois AMOR e feito de saudades, também!

Com muito carinho, desejo intensa LUZ e imensa PAZ !

Série Lembranças da infância