A espera

Quando você quiser ir embora, como fizeram todos os outros, vou fazer diferente, como nunca fiz. Arrumarei os cabelos, as lágrimas e as lembranças, e as colocarei dentro de uma caixa que caiba na sua mala. Não me despedirei, nem me derramarei em prantos. Você não me verá, tão pouco tentará me convencer que melhor assim será. Em cima da cama vai estar a caixa em que me guardo. E sem perguntar nada, sei que a guardarás na mala e seguirás enfim.

Antes que a curiosidade te domine, escorregarei pelas frestas da pequena caixa sem que você perceba e somente o meu amor sobreviverá ali dentro. Embora eu ainda não tenha certeza se conseguirá se alojar em tão pouco espaço. As lágrimas não cairão, nem desmancharão o desenho bonito que a caixinha tem, ficarão comportadas como nunca conseguem ser por nunca terem sido ensináveis, e agirão assim, para que as lembranças não se molhem, nem se estraguem.

Chegando ao seu destino, querendo ou não mudar de idéia. Sentirás fome. E ao tomar pra perto de si, a caixinha cujo conteúdo sequer questionou, ela, vagarosamente, exalará o cheiro das nossas comidas e de como fomos felizes a cada refeição. Antes que possas sentir-se arrependido o cheiro cessa e a caixa fecha. A viagem continua e não dá pra ficar onde se está.

Hora e horas do barulho do motor. E a dor de cabeça lhe fará sentir o toque das minhas mãos sobre os seus cabelos e minhas tentativas mágicas e inúteis de lhe curar. Mas o sono é tanto, que se mistura o sonho com as recordações, o amanhecer vem vindo doce como um menino que ao mundo acaba de chegar.

Os pés doem e a estrada atrai. E você, com certeza pensará: nada seria melhor do que o vigor da rede da varanda, e o cheiro de café exalando no ar.

A caixa permanece ali, vazia como um coração adormecido. Esperando ser lembrança boa o bastante pra te fazer voltar.