Voltando a escrever

Voltando a escrever...

Muito tempo não escrevo. O desânimo anda me rondando como uma imensa serpente sem veneno. Não o desânimo com as letras em si, mas o desânimo pela atmosfera ao redor. Sinto-me cansado e com vontade de chutar tudo para o alto, mas não sou bom em futebol. Quem sabe pegar o cetro mágico e ordenar meus desejos? Não acredito em magia e nem sou rei. Penso em mandar a todos para um lugar infecto e sujo. Não consigo pronunciar esse nome. Ficam todos onde estão. Eu vou cobrindo suas imagens com tinta virtual e criando uma outra realidade de novas paisagens humanas sempre viçosas bem atrás das minhas retinas, aprisionadas na minha caixa de pensar e delirar; usina de expurgar dores, filtrar realidades e reciclar sentimentos. O processamento interno era grande. Os produtos não eram aprovados pelo rígido controle de qualidade. Provavelmente os clientes não se agradariam. A fábrica não pode parar. Há que se manter produtiva. Busquei insumos, treinei, deleguei tarefas e estabeleci metas. A indústria avança e sinto o progresso crescer. Não consigo contê-lo. A poluição vem junto dele e traz a destruição...

Programa de despoluição implantado.

Retorno ao trabalho. Existe uma demanda enorme por novos produtos. O tradicional insiste em se manter. As inovações ainda pairam nas salas de criação e eu crio um meio de conciliar tradição e modernidade em algo de grande aceitação. A máquina não para, mas nada é distribuído. O mercado não aceitará. Há demanda? Acumulam-se pilhas e pilhas no estoque aguardando liberação. Não tenho transporte adequado.

Vou entregar pessoalmente e a pé a mercadoria. Ofereço. Concedo descontos e faço promoções imperdíveis. Perder-se, porém, é necessário. Jogar fora também. Destruir, então... é festival. Minhas ideias vão caindo no meio do caminho de pedras, entre espinhos. O vento sopra por cima a poeira. Choro e saliva vem fazer lodo. Quem sabe a semente germine e nasça o lírio. Jogo as pérolas, jogo as pedras, jogo as pétalas. O que mais jogar se não a mim mesmo nesse jogo de ir e vir segundo as regras opressoras duma época?

Oswaldo Eurico Rodrigues
Enviado por Oswaldo Eurico Rodrigues em 02/05/2019
Reeditado em 09/12/2020
Código do texto: T6637128
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