NO CHÃO COM ASAS

Ela não tinha certeza de nada. Caminhava com o olhar fixo no horizonte. Seus sonhos despertados depois de mais uma tempestade. De repente, parou e ali ficou, inerte. Sua mente trançava pensamentos para que eles não se perdessem.

Sentou na areia úmida. Olhou o mar, sentiu o ar salgado e afundou sua alma no momento. Estava toda nua, de uma nudez imperceptível, plena e quase dolorosa. Nenhuma veste cobria seus sentimentos. Era tudo novo, feito camadas descascadas de onde surgia uma pele nova, recém-nascida de desejos em placenta.

A brisa fria do inverno anunciado não a incomodava. Tinha muito para aquecê-la nessas fugas repentinas. Fugia de um mundo velho, das suas convicções já tão desgastadas e valores dilapidados. Mas tinha sorte. Muita sorte. Porque possuía coragem de sempre experimentar o que não estava à venda. Oferecia sua vida ao lado mais estranho, ao desconhecido, a quem poderia nunca chegar.

Enfiou as mãos na areia para sentir aquele chão que a sustentava. Não era areia movediça, desta vez. Era quase firme, composto de milhares de grãos como estrelas nos seus sonhos. No entanto, não podia ignorar a presença das asas. Elas estavam lá, leves, enormes, a puxando para cima, para o alto dos seus anseios.

Sem perceber, ela se levantou. Olhou desconfiada para as asas fantásticas que tremiam com a brisa. Os pés fincados no chão. Mas que chão? Terra e água misturados que desejavam ser mar. Ela desejava também - não o mar, mas amar.

Claudia Roberta Angst
Enviado por Claudia Roberta Angst em 21/06/2019
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