Gio

Sentado no meio da multidão, com um olhar supérfluo preso na escuridão, olho ao redor e só vejo caos, mas ao me atentar, vejo pelo vidro um limiar, cheio de brilho e cor, com tais olhos que mais se assemelham a uma flor. Digo para um ou para dois, quão linda tu és, surpreendendo-me com a junção de fatores que poderiam, entretanto, nos unir a seu jeito, foi como que se eu, em uma mesa de bar, olhasse para a prateleira e observasse a mais bonita das garrafas, atentava-me ao fato das histórias que essa garrafa poderia ter visto, queria escutá-las, me faltava, no entanto, coragem para sentar-me ao seu lado e tomar uma dose de vida.

Levanto e prezo pelo fim de mais um dia, só que em minha cabeça não esqueço de como a beleza se concentrou em um único espaço por alguns minutos, em um universo de solidão, semelhante às obras de Hopper, só que dentro disso, existia vida, assim como as pinturas de Margaret Keane, o que preenchia seu olhar não era um vazio presente e visto por todos, era vida.

A coragem para uma dose veio, mas acabei esquecendo a hora e me mantenho aqui, já foram tantos copos que me perdi, só que como no primeiro dia, o encanto permanece o mesmo.

Ao sair do buraco negro que se chama vida, subsidiado pela batida do relógio venho a te encontrar sorrindo, com a tranquilidade que somente a música que sai dos seus lábios consegue me passar, poderia ouvir por horas, dias, anos, mas ainda prefiro este momento, pois fora a primeira vez.

Mesmo com o decorrer dos dias, a garrafa mantinha-se cheia, transbordava sentimentos que nem mesmo ela acreditava possuir, perdia-se em palavras, por horas e horas, adoro observar a animação que se apetece em sua face, sobretudo quando está a falar de certas irmãs, mal sabe que isso não é um sonho, mas a realidade de um futuro que não pode ser explicado pelo amor fati, não existe algo inexorável, sua vida vai como o girassol que estou a admirar em Van Gogh, ganhando vida e certa cor que só pode ser explicada por ti.

Com uma dose de limão ou canela, lhe vejo crescer pela janela, mas o que queria era lhe ter perto, pois só assim conseguiria abraçar-te por horas a fio, afastar-me-ei se pensas que não deveria perder mais que alguns segundos aqui, entretanto, um segundo ainda é o suficiente, pois é nele que poderei salientar o mesmo que dá primeira vez, a beleza que se perde em ti, não digo de forma substancial, mas intrínseca em ti, advinda de seu peito, do seu carinho e preocupação quanto a um mundo digno para todos, dissestes que dentro disso tudo ainda há espaço para se importar com alguém que talvez nem valha a pena, mesmo assim, tirastes este velho da multidão, mesmo que as doses acabem, você permanecerá, pois és vida em um mundo morto.

Se amanhã o dia se perder em tristeza, sei que ainda haverá beleza, provavelmente estará vermelha, todavia, é a cor que melhor demonstra seu coração, pensas ser fria, entretanto, o calor que suas palavras transmitem, realizam uma verdadeira sinfonia.