"Tempo ido"

Nesta sucessão infindável, que se chama tempo, passam-se os anos, dias, horas e momentos. Esmiúça-se sem deixar ao homem sobras do que já passou. Saboreados ao tempo certo, os frutos degeneram-se e levam a terra fertilidade e reprodução. É o tempo o sêmen da eternidade, esteio fecundo da natureza e restaurador d´alma humana.

Se destes ao tempo contagens ríspidas, receberas dele urgência e imperfeição. Já se o contrário for supremo, receberás serenidade e perfeição.

Quão pesarosa estou diante do tempo que passou, sem ao menos chegar até mim. É o seu tempo que me faltou, àquele que foi e que nunca às vistas se revelou. Foi um tempo por mim desconhecido. Nascido em algum lugar, crescido também noutro e dissolvido neste meu tempo presente, mas já hoje é tarde.

É um tempo passado que ainda se faz presente, é momentâneo – transitório – quando em mim firma sua constância. Até o seu cheiro - do passado - se faz presente: cheiro de orvalho embriagado de suores e amores. É tempo passado, vivido!

Cego pela paixão, este já envelhecido tempo trafega por estradas inexatas. Tudo a ela pertence. O todo se esvai entre ela. É a estrada incógnita onde reina a incerteza, o breve e o atemporal.

O tempo, ora cantado, foi meu algoz. Carrasco do futuro – hoje já feito em presente – e demolidor de probabilidades. Sim, é devasso, mas essencial. Híbrido do destino, que por ventura foi compartilhado. É senhor e súdito, é rei e escravo, foi anjo e demônio. Hoje é apenas: o tempo passado.