"Feijãozinho"

Era um feijão diferente: tinha olhos arregalados, como que em espantos ficados. A boca era pequenina, de um vermelho claro com sabor de baunilha. Vestia um macacãozinho marrom, parecia uma “jardineira”, por baixo apenas uma camisa branca de botões. Era um boneco gracioso e cheiroso, tinha em volta do pescoço uma linda correntinha: uma estrela.

Dia e noite me acompanhava, quando ainda era uma menina. Dormia ao meu lado, sem fechar seus arregalados olhinhos, não tinha outra roupa senão aquela, pobrezinho!

Assistíamos à tevê juntos, almoçávamos e jantávamos no mesmo prato, era somente para não deixa-lo sozinho.

Um dia, ao ouvir uma fábula (João e o pé de feijão) tive a assombrosa idéia de enterrar o meu “Feijãozinho”. Eu queria ter outros “Feijõezinhos”, mas para isso seria preciso plantá-lo em local próprio, e cuidar para que crescesse forte e .... quanta inocência a minha.

Enterrei “Feijãozinho” num ritual estranho: eu cantava e sorria, parecia que realmente eu colheria outros “Feijõezinhos”. Dias se passaram até que finalmente esqueci do boneco que ficara enterrado no quintal da minha casa.

Hoje, passados os vinte e sete anos, “Feijãozinho” retorna em minha lembrança, como se ainda fosse crescer e me proporcionar outros “Feijõezinhos”.

No quintal, entre concretos e espantosas escadas e pisos, jaz inerte e já deteriorado o meu primeiro e único boneco – inesquecível por alimentar um sonho – “Feijãozinho”, a quem presto esta singela homenagem.