A cereja e o bolo

A pergunta que vamos nos fazer às vezes é: será que realmente isso tudo vale a pena? Tanta luta, tantos obstáculos. Às vezes vem a vontade de desistir. E é nesse momento que devemos parar, sentar e refletir sobre os caminhos que nos trouxeram até aqui.

Inevitavelmente essa pergunta virá, porque nossa essência é de uma matéria tão fantástica, somos feitos de uma energia tão inexplicavelmente viva, que não é comum que nós consigamos nos contentar com pouco. E toda hora que chegamos no ponto de achar que não fizemos nada, que não construímos nada, a essência grita para nos tirar da apatia: “Sois deuses.” E como que querendo nos confundir, mas na verdade para que não o façamos, diz também: “Aqueles que tiverem ouvidos que ouçam.”

E para que a fumaça da contradição, a névoa escura e densa que não nos permitiria conciliar essas afirmações, seja logo dissipada, basta lembrar que aquele que nos apresentou essas máximas foi um rei descalço e sem coroa. Ele foi grande e nos convidou a sê-lo no que realmente importa.

Daí a importância de buscar entender o que está além das palavras. Uma vida digna é um bolo delicioso e muito bem feito. A cereja no bolo é um adendo. Por tanto, um bolo é aquilo que a maioria busca. Não podemos de forma alguma deixar de pensar em quantas pessoas não tem mesmo migalhas. Quão felizes ficariam em o ter.

Mas não podemos deixar de pensar também que para chegar à cereja, primeiramente, não há outra forma, você faz o bolo. Depois coloca a cereja, se quiser, naturalmente. Você faz com calma a base, estrutura sua vida. Depois vai buscar aquilo que faz seu coração bater mais forte. Que faz o tempo desaparecer para você. Seja uma vida de viagens continuas ou uma de doação, como um empreendedor social.

Pode parecer que está protelando, mas não. Enquanto faz a base, naturalmente, você já está se preparando para a cereja. Para a coroação de uma vida digna, de um continuo não desistir, de não aceitar viver sem sonhos. De não aceitar ser uma pessoa triste, sem alma. Embora fique triste às vezes. Quanto a isso não há problema nenhum e muitas vezes é até útil.

Mas você não vai ser feliz apenas quando colocar a cereja no bolo. Pelo menos se você se permitir esses momentos de reflexão, vai ser feliz agora. Vai valorizar quem foi no mercado com você comprar os ingredientes, quem te ajudou a encontrar a receita. Quem te ajudou a fazer bolo. Vai passar brigadeiro na cara dele, vai se divertir. Porque a felicidade não está em colocar a cereja, mas na construção do bolo. No que se extrai nesse interim, nas pessoas que conhecemos e nos momentos que criamos, nas lembranças maravilhosas que ficam para sempre como imagens muito coloridas em nossa memória.

Vai lá então, busque seus sonhos. Não deixe ninguém dizer que você não vai conseguir. Vai atrás da sua cereja, não esqueça que podemos sim ter a cereja no bolo. Mas não se esqueça também que já ter o bolo é algo muito bom. Ele é não somente um prêmio de consolação, mas a base sem onde não poderia colocar a sua cereja. Pelo menos não a cereja famosa que chamamos de cereja do bolo. Um adendo, uma coroação, mas que não seja o pote de ouro ao final do arco-iris.