O átrio da liberdade é o horizonte
Avistei esses dias uma revoada de algumas últimas andorinhas
que ainda veraneiam em volta de um lago de águas turvas.
ascenderam sobre uma plantação de milho
que está começando romper a terra
e despertar rumo a luz do sol.
impressionado com a sagacidade
com a qual batiam as asas
indo em direção ao horizonte,
senti carcomer meus cotovelos,
uma dor errônea que me foi consumindo.
elas eram livres e sem repouso fixo.
não tinham paradeiro,
nem carregavam os grilhões de quando se está preso à terra.
com suas penas leves e asas arcadas para viajar
começaram formar, já distantes,
uma frase que só poetas
enxergariam.
um sussurro lançado no anoitecer fraco de lua antes de seu voo
ser substituído pelo das grandes corujas, donas da noite.
afastaram-se de mim, mergulhando no ar orgulhosas,
e agora já eram só um borrão de esperança
que estava para se desfazer na tênue linha
que separa as coisas pertencentes ao alto
das que rastejam por este solo rubro.
finalmente, não havia mais nada no céu.
apenas eu,
em meu chão,
com as minhas privações.
Memórias póstumas da Liberdade
Enviado por Memórias póstumas da Liberdade em 15/05/2020
Reeditado em 24/08/2020
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