JOÃO E MARIA

O céu azul novinho em folha

- Maria eu vou, mas volto pra te buscar.

Primeiro vou eu na frente,

Arrumo um lugar decente,

Pra nós três ficar.

E assim João Partiu

Tomando o rumo do sul.

Desesperançado de março.

Foi-se embora em abril.

Foi-se embora pra São Paulo

Tão longe buscar trabalho.

E se perguntou num estalo, porque precisava ir?

Por que precisamos ir?

Chegou no meio do mormaço

No firmamento um céu cinzento

Diferente e sem azul

No chão só asfalto, só cimento,

Não se pode andar descalço.

Olhou pra cima buscando o tempo.

Só prédios altos; bateu um escurecimento.

Sentiu um aperto no peito.

Aquele de quem tem mau pressentimento

Bateu saudade do seu filho e de Maria

E maldisse do dia, da sorte e do sofrimento de quem erra.

Por que foi deixar o norte para vagar pelo sul

Sentiu-se meio sem jeito; olhou de novo pro firmamento,

Sentiu saudade do céu de sua terra

Tão limpo e tão azul

-Deus meu, mais um dia e ele volta.

Ele vem pra nos buscar.

Meu Deus! Passou-se um ano

Ele encontrou lugar pra gente?

-Vem menino, vem moleque,

Nesse envelope, quem sabe,

O dia de nós partir

João arrumou lugar pra gente

E escreveu pra eu e você ir.

-Mas dentro só veio saudade

E dinheiro pouco para resistir.

-Deus meu! Um dia ele volta?

Ele vem pra nos buscar!

Meu Deus! Passou dois anos

Ele não arrumou lugar!

Vem menino, vem moleque,

Traz pra mim esse envelope

Hoje eu vi pela TV

Ele tem cheiro de morte

Só viveu quem teve sorte

Mim dá aqui para mamãe vê

Se papai volta pro norte

Pra buscar eu e você.

-Maria vem me buscar.

Eu já nem posso ir.

Fiquei sem perna e sem braço,

Mas deu pra resistir.

Muito sangue no cimento

Até me deixaram nu

Não arrumei lugar decente

Quase Fiquei demente

Maria vem me buscar!...

Nunca mais o céu do sul

Não me querem mais pra trabalhar

Mendigar é morte pra quem trabalha, e é certo faltar o pão.

Estou vivo e se Deus me der a sorte!

Eu quero voltar pro norte e antes da minha morte!

Quero pisar na minha terra; cheirar o mato; beijar o chão!

Olhar o firmamento vê o céu que Deus em pessoa,

Pintou de um azul novinho em folha,

com os dedos da própria mão.

Manuel Oliveira
Enviado por Manuel Oliveira em 17/10/2007
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