Pomarola

Comprei a vista à vista, ganhei de 3% de desconto do cigano que tinha uma cicatriz no queixo e usava dreadlock.

Passei a enxergar e orava todo santo dia agradecendo a graça alcançada. Treze dias depois, quando olhei no espelho, reparei como os meus olhos eram vermelhos, então percebi que só via a cor vermelha com sombreamentos nas bordas que determinava a definição das formas de cada coisa.

Também não conseguia visualizar nada que fosse da cor vermelha, tudo em vermelho era invisível pra mim. Porém, quando rolava algum sangramento em meu corpo enxergava a cor verde no sangue.

Quando visitei Bumbai contei toda a resenha envolvendo o cigano, e as cores vermelho e verde para o meu guia espiritual. Então sabiamente o jesuíta refletiu: “você é como uma lata de extrato de tomate da Pomarola ao contrário, aquela embalagem clássica com um elefante verde desenhado, se lembra agora”? Acenei um não com a cabeça. Ele continuou: “enfim, acho que é o elefante da Turma da Mônica, acho que se chamava Arisco, você é ele ao contrário, por ver vermelho por fora e ser verde por dentro, o contrário é complexo mesmo, logo você vai entender, meu caro Alfie Solomon”.

Da índia fui direto para um zoológico na Cidade del Leste, ao observar um elefante sem tromba, mas que tinha penas e bico, me toquei que a lata da Pomarola era vermelha por fora também, pelo menos antes da minha visão ter sumido era. Claro, fiquei frustrado, indignado. A partir de então macarrão já não me descia bem, pois entrava como um quadrado, feito aquela propaganda antiga da Skol (acho que pararam com a ideia por perceberem que a própria Skol era quadrada),

Certo dia descobri que meu sangue verde tinha gosto de manjericão. Comecei a transitar na dúvida, até que em pleno Brumário endossei uma revolução bolchevique e cortei a cabeça da rainha santa que foi casada com o bandoleiro Sete Orelhas. Dei um golpe de Estado em Varginha e parti com os guerrilheiros do Araguaia rumo a Macau.

Virei o santo da culinária em Canudos, o Império não tolerava debaixo de sua saia, ex-famintos bem nutridos em pleno sertão, chamaram o gravata vermelha, não via mais vermelho, só verde, todo nordeste exalava manjericão.