Pedido de desculpas

Hoje venho aqui escrever para me desculpar.

Para me comprometer a ser melhor.

Ser melhor do que me ensinaram a ser.

Ser melhor do que minhas escolhas me fazem ser. Sim escolhi e escolho muitas vezes conscientemente.

Estou comprometida em rever o que fui ensinada moral, social e culturalmente .

Não vou me desculpar pelo que meus antepassados fizeram pois nenhuma palavra é capaz de apagar ou reparar as atrocidades que foram feitas e que ainda acontece. Falo apenas por mim.

Nasci mulher, branca, meados da decada de 60 , numa família católica e pobre. Família onde não havia debate sobre nada , não se falava sobre politica ,não se questionava nada , não havia diálogo .

Fui ensinada desde cedo que os homens mandam, que são melhores , mais fortes que as mulheres, que existimos para servi-los , que somos dependentes deles.

Que devemos sentar direito, não usar roupas provocativas, as mulheres que usam são vadias e se acontecer algo, nunca fui ensinada o que era esse algo , a culpa seria minha.

Mulheres descasadas não prestam, alguma coisa errada elas fizeram para ser largadas.

Fui ensinada a ter cuidado com pessoas negras, principalmente os homens, por não serem confiáveis.

Fui ensinada que cada um tem que ficar no seu lugar. Preto com preto, pobre com pobre, mulher deve ser submissa aos homens. Pobre servindo rico . Que para o pobre basta saber ler e escrever , pobre não vai para universidade.

Fui ensinada que deus castiga e que tudo de ruim que me acontecer é culpa minha, que eu provoquei .portanto sou castigada.

Se um homem me tocar a culpa é minha porque alguma coisa eu fiz para provocar, homens são assim mesmo , a mulher que tem que se dar ao respeito.

Mulher foi feita pra ter filhos, cuidar do marido , da casa, homens podem fazer o que quiser.

Mulher honesta não fica sem roupas nem na frente do marido. Sim! Minha mãe se orgulhava de dizer que meu pai nunca a viu sem roupa e que ela só viu meu pai nu quando ele estava muito doente.

Fui ensinada que se um garoto é efeminado , essa era a palavra que usavam , é culpa da mãe dele que não soube educar. Sobre meninas não se falava.

Todos esses ensinamentos se deram em forma de frases soltas, reprimendas , avisos e ameaçadas, nunca o diálogo . Fui alimentada com racismo , machismo , homofobia, gordofobia e baixa estima.

Cresci assim. Algumas vezes desafiei as ordens.

Fiz amizade com meninas negras, não posso dizer que não era racista porque essa palavra não existia no meu vocabulário, tampouco o conceito , apenas não via sentido em não falar com elas por causa da cor da pele. Tive amizades com filhas de mulheres desquitadas , ouvi muitas broncas por isso , mas desafio e descrença existiam em mim , o que me levou a muitos enganos, entre eles de confundir abuso sexual com amor, só fui entender isso há poucos anos atrás.

Questionei os ensinamentos da igreja , era a única menina pobre no catecismo, não encontrei o tal amor ao próximo ali e nem anos depois na igreja mórmon. Outro grande engano.

Rompi com muitos dos ensinamentos mas eles estão enraizados e por mais que eu arranque as vezes em falas e atitudes eles brotam.

Conforme a idade foi passando entrei em contato com outros ensinamentos , outros valores, amplio meu vocabulário, busco outros conceitos todos os dias.

Rompi com religiões , questiono a política , me posiciono.

Me tornei vegana por entender o sofrimento e a exploração animal

Me auto fiscalizo.

Não tenho problemas em seguir outro caminho que entenda ser mais coerente .

Então...

Peço desculpas pelo racismo que há em mim.

Peço desculpas pela homofobia que há em mim.

Peço desculpas pelo machismo que há em mim.

Peço desculpas pela falta de sororidade que há em mim.

Peço desculpas ,a mim , pela minha baixa autoestima .

Me comprometo vigiar meus pensamentos e principalmente as ações .

Vigiar, orar não mais! Deixei de crer nesse deus egocêntrico, vingativo , preconceituoso e punitivo que anda por aí de religião em religião, limitando tantas pessoas ,impedindo as de pensar.

Me compromento hoje ao completar 54 anos , a ser melhor que já fui antes e que sou agora.