A IRIS DO SOL


Caminho pela casa. Arrasto a rotina com um certo vagar. Concluo que já aceitei o desafio. Amei o silêncio. Não... nada de tédio.

Enfrento impulsivamente um espelho enorme: o mundo passando à minha frente, sob meus pés. Um filme sem o seu final. Um adágio. Uma sonata entrecortada de soluços... Sorrisos mofados...

A coisa é esta. O silêncio sempre me despertou fascínio. Salpicos de nada. Vazio. O silêncio da noite, o silêncio de uma flor, o silêncio! O silêncio imponderável, a ausência de vozes, a falta de tudo que se possa desejar. O silêncio... Nada. Ninguém! E mesmo assim ter esse poder de ler nele todos os sons do coração.

E sigo, assim, nesse passeio pela casa, visitando cada recanto, balbuciando silêncios, observando tudo e imaginando que nada disso é permanente... Reflito sobre essas ausências Sei que preciso aprender a beber dessa fonte onde jorra meu tempo assumidamente. Entrar na essência de tudo e lá perder-me ou achar-me e perguntar-me num relance: "para que serve tudo isso?. Para que serve um abraço, para que serve saber ler os detalhes, para que serve interpretar a íris do sol que se esgueira pelas frestas da janela?

Pois bem, tudo tem sim, uma serventia. Até mesmo a paciência da gente. Nada fica em desuso. E se o silêncio me aborrecer, digo que sim, que estou exausta. Que a monotonia me devora, mas eu nem ligo. Finjo que não a vejo. Finjo que nem noto.

Sigo adiante esperando pela definição das ondas... ondas sonoras, ondas da vida. Fecho a porta e tanjo o silêncio. Escuto uma música. Apoio meus braços no tempo e me deixo conduzir e seduzir. Libero meus movimentos, danço pala sala. Solfejo uma canção. E depois volto às flores, ao jardim, à luz e ao seu obstinado silêncio.