O Quarto

 

Vi aquele passado nas paredes do quarto,

Todas as estações fizeram-se presente.

Todas conspiraram a favor.

Tudo muito forte a sangrar a sorte,

A desarrumar o lençol.

 

Havia nesse quarto de pouca beleza

Um segredo contido

Sem orquestra a conduzir a fraqueza.

O que dedilhava a vida a trazer músicas

aos ouvidos

Era uma canção de amor,

De um grande amor proibido.

 

O relógio ficava mudo estatelado num canto.

Ele não se atrevia a badalar meu pranto.

No canto direito do quarto a cama redonda

Rangia,

Se falasse quantas histórias diria.

 

Hoje as paredes têm nova roupagem,

outros tons, outros sons.

Mas, por mais que se passe tinta,

o passado se agita,

Volta e meia se contorce.

 

Por debaixo das tintas frescas lembranças,

lembranças caducas voltam.

São visgos grudados as teias 

A badalar nas noites e meia a trazer o cheiro,

O perfume de outrora.