Voo Rasteiro

Observa o caricato caro Álvaro:

Eu que te admiro e te tenho como ídolo

Mudei de casa e de cidade

E descobri que a rua para onde vim morar

Tem o nome do teu homónimo.

Dei à coincidência uma importância comedida

E avistei da terra firme arborizada

Neste interior sem odor de maresia

As chaminés do navio em que à deriva me tornei

Desconhecendo quantas mais fronteiras

Serão a raia que vez alguma transporei.

Encontrei a velharia das familiaridades

No envergonhado pretérito do abandono

Empenho entusiasmado quando o tempo é de acção

Mas que o cansaço vai dobrando

À mediocridade da razão.

Achei-me burlesco

Ridículo porque nem sequer tenho usado o meu chapéu

Perdi as referências que não sei se alguma vez houve

Nos paralelos da calçada soam os ecos dos passos

Que no quarto alugado

Abafam a indiferença das horas mortas.

Moisés Salgado